O Governo e PS não podem romper

1. Mário Soares tem subido as críticas ao Governo e fala de ruptura com a troika. Seguro também endurece as críticas ao Executivo. Admite a ruptura entre o PS e o Governo? E que consequências terá?

considero inconcebível a ruptura entre o governo e o ps.

em várias ocasiões – desde logo, no encerramento do congresso do psd – tenho manifestado a minha preocupação com esse afastamento. qualquer patriota – militante do psd, do cds ou do ps – sabe bem que é do mais relevante interesse nacional a existência dessa base de entendimento no essencial.

ao dizer isto, não estou a considerar anti-patriotas os militantes de outros partidos.

cada um pode ter o entendimento que quiser sobre o memorando da troika e as suas consequências políticas.

mas que se desenganem os que correm depressa demais a ‘lançar foguetes’, de censura ou de ruptura, por sentirem as dificuldades da situação. não se precipitem. os números da evolução do pib, no 1.º trimestre, aconselham prudência aos pregadores da desgraça. é fácil ‘empurrar para baixo’. ajudar a reerguer é mais difícil. mas é disso que portugal precisa.

temos todo o interesse em que a situação portuguesa seja bem diferente da grega. e essa é uma das grandes componentes da distinção: o sentido de responsabilidade e a capacidade de formação de consensos entre o governo e o maior partido da oposição.

é uma questão de dever para com portugal e para com os portugueses.

2. passos coelho foi vítima de nova manifestação hostil. viveu algum episódio destes quando foi primeiro-ministro? acha que passos se expõe demasiado?

felizmente, não. lembro-me de uma manifestação de professores em coimbra, liderada por mário nogueira (julgo), enquanto decorria um conselho de ministros, mas com ordem e respeito. não me lembro de ouvir qualquer insulto. outra vez, quando entrei no pavilhão atlântico (que estava esgotado), uma parte começou a assobiar mas a outra metade a aplaudir.

devo dizer que, no dia da demissão de um ministro do meu governo (que antecedeu em dois dias o anúncio da dissolução do parlamento), tive em vila pouca de aguiar uma das maiores – se não a maior – recepções de apoio a um primeiro-ministro a que assisti na vida. e assisti a muitas, pois acompanhei vários, chefes de governo – começando por francisco sá carneiro, continuando com francisco pinto balsemão, cavaco silva e durão barroso. horas antes, logo de manhã, em ribeira de pena, já tinha sido muito boa. mas em vila pouca foi impressionante e inesquecível. havia gente nas ruas, nas varandas, e o cine-teatro estava repleto. por vezes, encontro pessoas que lá estiveram e que me dizem o mesmo.

conclusão: nenhum primeiro-ministro se deve impressionar com manifestações – nem com as hostis, nem com as de apoio. meditar, sim, impressionar-se, não.

quanto à exposição, entendo que pedro passos coelho deve ser igual a si próprio. por mim, gostei de, numa altura destas, o ver a passear com a mulher na feira do livro.

3. quando foi chefe do governo promoveu a deslocalização de alguns serviços. agora o assunto volta à baila, com os funcionários públicos a poderem ser deslocados sem contrapartidas. como vê este fenómeno?

continuo a considerar essencial a deslocalização de serviços e instituições. é fundamental para dar vida, devolver esperança ao portugal desertificado.

se a troika for inteligente – e nem sempre tem sido – deverá apoiar um programa nacional de estímulo à mobilidade territorial na função pública. há despesas de investimento que são verdadeiramente reprodutivas, e os funcionários que aceitem ser deslocalizados para terras onde não tenham casa nem família devem ter apoios especiais.

não concordo de todo que essa mobilidade possa ocorrer de modo impositivo e sem contrapartidas. governo, oposição, entidades financiadoras do programa de reajustamento, todos devemos assumir esta causa como um desígnio nacional. trata-se, também, de um imperativo patriótico.