Spengler para o jantar

Oswald Spengler (1880-1936), é um autor que hoje ninguém lê, ou admite ler, já que é difícil encontrar alguém mais nos antípodas do que é a correcção ética, política e civilizacional dominantes, o pensamento único ao qual são admitidas variantes mas não alternativas.

descobri-o na adolescência, naquele tempo da vida em que nos seduzem pensamentos arrojados, arejados, em contracorrente, às vezes nos limites do niilismo e da autodestruição.

desse tempo há autores, como nietzsche ou pessoa, que ficam sempre connosco, embora os vamos olhando de modos diferentes. outros, é o caso de spengler, têm épocas, ciclos, vão e vêm.

os anos decisivos entusiasmaram-me nesses ‘anos decisivos’ em que faziam sentido as decisões dos portugueses sobre portugal. spengler era importante pois fora dos primeiros a falar das massas, das ditaduras, dos césares, da decadência e destruição de elites e impérios.

era um visionário – como nietzsche e pessoa – mas não tinha o pathos poético, faustiano, universal, de qualquer deles. era um pessimista racional, histórico, com uma visão muito centrada na crítica da civilização técnica e das suas formas do utilitarismo e do mecanicismo individualistas que, para ele, depois de levarem aos píncaros a civilização do ocidente iam trazer o seu fim.

lembrei-me agora dele a ler um livro de alain de benoist – mémoire vive – que o cita com frequência, como um dos poucos pensadores que compreendeu mais cedo o lado trágico do século xx, como tempo do declínio da europa…

spengler, além de ter crismado a ideia da ‘decadência do ocidente’, viu com aquela clareza que tanto incomoda os intelectuais orgânicos de todas as repúblicas, as raízes do mal. ou melhor, viu um certo lado da marcha da história e do progresso do mundo euroamericano que fatalmente o levaria à decadência. viu também, que nem os césares, nem as massas, eram remédios para esse declínio.

porque o problema era um problema de ‘valores’ ou de padrões éticos e os padrões do ocidente e do pensamento único – fosse o liberalismo, fosse a reacção antiliberal, fossem as modernas doutrinas da globalização e dos ‘direitos do homem’ – não eram soluções ou artifícios que pudessem parar a irremediável marcha do resto do mundo para posições de vanguarda que tinha sido europeias.

vale a pena relê-lo tendo por pano de fundo a grécia e as cimeiras em que não se vai decidir o nosso destino.