Stevie Wonder fez a espera valer a pena

Deitado no chão, um sorriso na cara e agarrado a uma keytar, onde carregava ritmos que, empurrados por uma banda de 13 músicos, contagiaram as quase 70 mil pessoas que se ergueram diante do palco principal. Este cenário juntou-se nem dez minutos de concerto tinham passado, e deu o mote para o restante espectáculo com que,…

a espera teve quer ser longa. terminado o concerto de bryan adams, a montagem do palco para stevie wonder estendeu-se durante quase uma hora, o suficiente para ir reunindo uma ansiedade que a entrada do músico de 61 anos fez explodir logo nos primeiros ritmos que atirou.

o norte-americano, vencedor de 23 grammys e um ícone da música negra – foi o primeiro a conquistar o prémio de melhor álbum do ano -, voltava a pisar solo português quase 30 anos depois de, em 1984, ter comparecido perante um estádio do restelo que, ao contrário de ontem, não reuniu a moldura humana para receber uma lenda viva da música soul.  

sentado diante dos seus órgãos e piano, stevland hardaway judkins, que a carreira baptizou como stevie wonder, liderou um público sedento de dança, ansioso por viver a energia que o cantor lhes transmitiu com uma viagem pelo seu curriculum musical, sempre acompanhado por um sorriso e autenticidade, cujo contágio tornava quase obrigatório ir dançando ao ritmo  de canções reminiscentes das décadas de 60, 70 e 80.

e nem sempre as quase duas horas de concerto se basearam só no seu reportório. quando ia já na meia hora de concerto, ‘stevie’, como muitas pessoas o tratavam nas suas congratulações, perguntou no ar se toda a gente estava em pé. aí, o público respondeu em massa, cada vez mais empurrado também pela energia de temas que o norte-americano ia buscar, por exemplo, a michael jackson, como o the way you make me feel.

a sua hora de entrada em palco, a rondar a 1 da manhã, levou-o a procurar ‘acordar’ ainda mais o público, que tanto esperou por ele. como tal, não se cansou de interagir e de fazer rir quem o via. quando os tímidos e ligeiros chuviscos se fizeram sentir no parque da bela vista, decidiu recordar o imortal tema raindrops keep fallin’ on my head, que hal david e burt bucharach composeram para o filme butch cassidy and the sundance kid.

seria na segunda parte do espectáculo que stevie wonder pegaria nos temas que o empurraram para os grandes êxitos da sua carreira, e que puxariam ainda mais pelo público. ao rápido e melodioso superstition, a que corresponderia ainda sir duke, sucederiam canções como i just called to say i love you, tema originalmente dedicado a nelson mandela, ou isn’t she lovelly, onde chamou a sua filha, aisha morris, para se sentar ao seu lado – o cantor escreveu o tema aquando do nascimento da sua filha, em 1976.

pelo meio, houve tempo para recordar bob marley, ícone do reggae com quem wonder partilhou palco na década de 70, tanto na jamaica como nos eua. o tema master blaster, que compôs em sua homenagem no álbum hotter than july (1980), foi o primeiro a surgir e, já na parte final do concerto, o lendário cantor seria uma vez mais recordado, na reedição do tema i don’t want to wait in vain.

ao fim de quase duas horas de concerto, o barulho do público ainda conseguiu fazer com que stevie wonder e a sua banda regressassem para um encore. muitas pessoas, que pelo peso das pernas e cansaço acumulado já estavam sentadas no chão, voltaram-se a erguer para uma última canção.

«até vos voltar a ver, desejo-vos amor vindo lá de cima», disse, ao despedir-se. o público retribuiu com um carinho em forma de palmas e gritos, com a sensação de que ontem, a espera valeu a pena.

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