Indexar os salários à produtividade

1. Depois de António Borges ter dito que «a diminuição dos salários não é uma política, é uma urgência», veio a troika alertar para a necessidade de Portugal adoptar medidas para «flexibilizar os salários». É inevitável baixar ainda mais os custos do trabalho, como diz o próprio ministro Vítor Gaspar?

a propósito da necessidade de redução de salários, continuo a defender o que defendi como primeiro-ministro, em setembro de 2004, e que tencionava levar à prática se não tivesse acontecido o que se sabe: o aumento de salários deve ser indexado ao aumento e melhoria da produtividade.

em termos relativos, portugal tem custos unitários de trabalho, na verdade, pouco competitivos. faz-me muita impressão que em portugal esta vexata questio ainda não tenha merecido a devida atenção. já aqui o escrevi várias vezes: em portugal, muitas vezes, o mais difícil é tratar o que é óbvio. a nossa produtividade continua muito mal situada em termos europeus, pouco acima da média. e, enquanto essa situação não se alterar, continuaremos com a economia a não crescer o que devia – e a termos de reduzir a despesa para níveis, por vezes, incomportáveis.

reduzir esses custos faz sentido, mas é necessário olhar para o ‘outro lado da moeda’. mais do que reduzir salários é importante estimular a produtividade e, infelizmente, só muito poucas pessoas falam nisso. aqui, sim, justificar-se-ia um grande acordo de concertação social, com um modelo do tipo que é praticado na autoeuropa. um acordo em vários domínios, mas com esta relação bem assumida: os salários baixam menos (ou então não baixam) se a produtividade aumentar (ou melhorar), para que, daqui a uns tempos, possam voltar a subir. é estranho que nem da troika cheguem notícias de especial insistência nesta questão. voltámos à redução da tsu, mas da produtividade não se ouve falar.

2. os chefes de estado, quer em repúblicas quer em monarquias, gozam em geral de grande simpatia popular. os elevados índices de popularidade da rainha isabel ii, no momento em que a inglaterra celebra os seus 60 anos de reinado, deveriam servir de exemplo para se permitir, nos regimes republicanos, uma maior duração dos mandatos dos presidentes?

não acredito que uma coisa tenha a ver com a outra. além disso, a popularidade da rainha já conheceu oscilações significativas. a popularidade advém do facto de não se ter decisões para tomar, de se ser um símbolo e um elemento de unidade. aliás, as rainhas ou os reis são ainda mais populares quando deixam de o ser (lembre-se, a propósito, a rainha-mãe, popularíssima mãe de isabel ii).

em frança, o mandato do presidente já foi de sete anos e, no final do século passado, foi alterado para cinco – o que não teve qualquer consequência nos níveis de popularidade. esta depende das pessoas que são titulares dos cargos e das circunstâncias. além disso, prolongar a duração de mandatos seria apostar num dos contras da monarquia: mesmo que o chefe de estado seja mau, não pode ser mudado. neste caso, em república, demoraria mais tempo a ser mudado.

a opção, portanto, é: república ou monarquia. e, noutro plano, presidente com poderes ou mera figura representativa.

3. nos últimos 16 anos, a selecção de portugal chegou sempre, pelo menos, aos 1/4-de-final do euro. teme que, desta vez, não passe da fase de grupos?

pois… não vai ser nada fácil e os ensaios não animaram ninguém. mais do que os resultados dos jogos de ensaio, causou-me apreensão o estado de espírito que transparecia nos semblantes dos jogadores numa cerimónia, durante o estágio, em que crianças de escolas lhes liam os seus escritos…

só com humildade e grande entrega será possível ultrapassar os adversários que nos calharam em sorteio. é um grupo muito difícil, embora tenhamos alguma tradição (entre a selecção e clubes) de derrotar os alemães quando eles menos o esperam. a dinamarca está perfeitamente ao nosso alcance e, sendo um jogo do ‘meio’, nesta fase, se não perdermos a primeira partida, pode até ser o momento certo para garantirmos a qualificação. diz a pergunta que há 16 anos que ficamos sempre entre os oito melhores da europa. manda a verdade dizer que também não há nenhuma razão para que seja sempre assim e para que queiramos no futebol, de que se diz tanto mal, atingir níveis que não conseguimos noutras áreas.

uma coisa é certa: a nossa selecção, normalmente, surpreende. seja no mau, seja no bom sentido. como já foi dito, estando as expectativas baixas, pode ser que a surpresa seja boa.