mas esta crise foi precedida e causada por uma quebra do poder político e militar dos estados europeus. a força da europa no mundo não vinha de uma vaga hegemonia de prestígio cultural ou de pioneirismo ideológico. vinha do poderio estratégico e industrial das suas nações. há cem anos, os grandes poderes mundiais eram os estados europeus.
duas guerras civis europeias, que destruíram tanto os vencidos como os vencedores, puseram fim a esta hegemonia. o grau de destruição material da europa no termo da segunda guerra mundial pode avaliar-se no cinema de rossellini, nesse germania, anno zero, com a contemplação de berlim arrasada. mas ainda mais forte é a saga das personagens, que parecem – e são – mortos-vivos, candidatos a suicidas.
é só percebendo a reacção emocional e histórica dos sobreviventes deste conflito em que as cidades e os civis estiveram nas frentes de batalha, dos bombardeamentos, das ocupações, das deportações em massa, das represálias, dos massacres, dos genocídios, que se entende a ânsia de respirar, de viver, de gozar, o hedonismo pragmático depois da reconstrução.
o projecto da união europeia foi uma clara opção pelo bem-estar dos cidadãos contra os custos do poder nacional. daqui resultou uma união essencialmente mercantilista e a criação de um espaço político de natureza programática e utópica.
esta construção beneficiou, durante a guerra fria, do chapéu de chuva do aliado norte-americano e da coesão imposta pelo perigo soviético. procedeu resignada à liquidação dos seus últimos impérios, com alguma resistência onde havia populações de origem europeia fixadas com continuidade.
com o fim da guerra fria tudo mudou. num mundo globalizado e de concorrência livre entre espaços económicos, a europa que não produz energia nem comida e que – com excepção da alemanha – deixou de fazer coisas que os outros comprem, está em desvantagem. não tem agricultura, nem indústria competitivas é uma terra de serviços financeiros e turísticos, um museu a céu aberto, um lugar onde os que ganham dinheiro no resto do mundo vêm gastá-lo. e cada vez tem menos capacidade político-militar num mundo que se tornou perigoso.
não se trata só de finanças. trata-se de poder, de política.