«neste momento, é preocupante o número de abandonos escolares. o absentismo pode estar a ser motivado por carências económicas e isso pode significar que as crianças estão envolvidas em actividades de maior clandestinidade, de tráfico de droga, de ilicitude criminal e sexual», adverte manuel sarmento, professor da universidade do minho, com estudos na área do trabalho infantil. «esta situação faz aumentar os factores de desprotecção das crianças e pode renascer a ideia de trabalho infantil», acrescenta o investigador do instituto de estudos da criança, em declarações ao sol.
manuel sarmento assegura que, nestes tempos de crise económica, «o trabalho infantil tradicional só não cresce porque há escassez de emprego para a população em geral». ainda assim, este especialista acredita que haja crianças a trabalhar em casa.
os especialistas, contactados pelo sol, receiam que o fim das equipas (compostas por psicólogos, assistentes sociais e professores) afectas ao único programa de prevenção e combate ao trabalho infantil que existia em portugal, o peti/piec (programa para a inclusão e cidadania), venha a comprometer o trabalho do pief (programa integrado de educação e formação), o único instrumento que restará do extinto piec.
o fim do piec – programa que disponibilizava equipas que viam, no terreno, quais as necessidades das crianças –, ocorre numa altura em que aumenta o número de alunos do pief, programa desenvolvido nas escolas, até ao 9.º ano, que procura resgatar as crianças das situações de risco. segundo dados provisórios do ministério da educação, neste ano lectivo, 3.296 crianças estavam a frequentar aulas pief – um aumento de 1.209 face a 2009/2010.
«com o fim do piec, vai passar a tratar-se o problema social da criança como se fosse apenas um problema escolar», critica fernando coelho, que coordenou o peti/piec da região norte, entre 2004 e 2010: «vai deixar de se ir buscar o aluno a casa, para ir às aulas, ninguém o vai levar ao centro de saúde».
os dados da comissão nacional de protecção das crianças e jovens em risco (cnpcjr) evidenciam, aliás, um aumento de risco de abandono escolar na ordem dos 13,3%. em 2010, houve 7.856 situações de perigo em que estava em causa o direito à educação e, no ano passado, o número subiu para 9.737.
e, no relatório de 2011, a cnpcjr identificou como principais dificuldades, no acompanhamento das crianças, «a escassez de técnicos e e a falta de respostas sociais». «nestas circunstâncias, as políticas de protecção têm de ser em contra-ciclo e o que se está a verificar é a redução da protecção», lamenta manuel sarmento.