‘É-me muito fácil trabalhar’

A apresentar, acompanhada, um programa em estúdio, Leonor Poeiras teve de aprender a praticar o silêncio: «A dar espaço ao outro». Acredita que a descontracção é o seu maior trunfo, mesmo quando falha em directo na televisão.

se tivesse continuado na informação, onde começou a carreira, ainda estaria a fazer televisão?

acho que sim. se calhar, não tão feliz. sinto-me muito mais realizada no entretenimento.

no início, fazia uma rubrica para o programa diário da manhã, em directo de alguns cafés. era quase como estar com uma perna no entretenimento?

na época, não tinha a consciência de que os directos que fazia fossem o que está a dizer. a ideia era entrevistar o cidadão comum, com o jornal debaixo do braço, falando sobre as notícias do dia. perguntava às pessoas o que tinham para dizer, dando o microfone para falarem sobre o que quisessem, para mandarem beijinhos e abraços… eram realmente conversas mais leves do que o resto do programa, que era um noticiário.

por que se diz mais feliz no entretenimento?

tem muito mais a ver comigo. um jornalista não pode expressar grandes opiniões e para eu trabalhar na informação teriam de retirar-me a espontaneidade e a genuidade, e isso seria difícil. tenho dificuldade em conter-me nas palavras. aliás, na faculdade sempre soube que me daria melhor na televisão do que na imprensa; expresso-me muito melhor através da imagem, com as palavras, com os gestos, com o corpo.

a informação perdeu uma boa jornalista ou a programação ganhou uma boa apresentadora?

acho que o entretenimento ganhou uma apresentadora diferente. para vingarmos, convém não sermos a cópia do que já existe e termos algo novo para dar.

o que é que trouxe de novo?

a descontracção. sou uma privilegiada: o meu trabalho, para além de me deixar muito feliz, é-me muito fácil. o que não retira nenhum profissionalismo à coisa. mas não é um esforço, nunca foi. e isso é maravilhoso. daqui a um bocado vou estar em directo e não estou minimamente preocupada. pode cair um projector ou desmaiar alguém que não fico nada nervosa.

alguém já desmaiou ao seu lado?

por acaso, não. mas já me içaram. nos meus tempos de informação, estava a fazer directos de um estádio de futebol e fui… fui acariciada pelos fanáticos do futebol. para resumir, estavam a pôr-me as mãos no rabo! como estava em directo tive de manter a postura, mas acabei por impor algum respeito.

esse vídeo está no youtube. sabia que estava em directo?

não sabia, por isso, gerou-se aquela situação. mas não me envergonho daquelas imagens. a minha descontracção passa também por aí. acho que o josé eduardo moniz apostou em mim porque apanhou uma ou duas situações em que falhei completamente em directo e dei a volta. quando algo corre mal, penso que é um dia de trabalho e que amanhã será melhor.

faz há muitos anos o horário da tarde e diz sempre que gosta de o fazer.

adoro o meu horário. nunca senti aquela ambição de ir para o horário nobre. tenho um enorme respeito pelo público, e sei exactamente quem me vê à tarde. tenho acesso aos estudos de audiência e conheço os espectadores por idades, por regiões, etc.

e nota uma evolução no seu público?

há uma evolução triste, porque há mais gente em casa. há quadros médios de empresas, médicos e arquitectos que ficaram desempregados. não quero com a minha afirmação melindrar alguém, mas há pessoas mais exigentes a ver o meu programa. e é bom saber que esse público me vê e também me dá feedback.

escrevem-lhe cartas, por exemplo?

escrevem-me imensas cartas e abordam-me na rua, mas apenas aquelas pessoas que gostam mesmo de mim e se sentem acompanhadas por mim. são os reformados, os estudantes, as crianças e, agora, os desempregados.

o facto de ter crianças a vê-la obriga-a a mudar o discurso?

no programa que estreou, o vídeo pop, temos imensos vídeos com coisas engraçadas e eu alerto: ‘não façam isto em casa’. e tenho muitos miúdos que comunicam comigo pelo facebook. adoram-me, porque acham que eu sou uma deles. pensam que as pessoas que trabalham em tv têm uma equipa inteira atrás delas, tipo divas, e que eu não sou assim.

agora que está em estúdio com nuno eiró, acha que é melhor trabalhar em parceria ou sozinha?

neste programa fazia sentido estarmos em dupla, porque há muita contracena, e torna-se interessante para quem está em casa assistir àquela dinâmica.

o que é que se aprende quando se trabalha em parceria?

a praticar o silêncio. imagine, estou há seis anos a fazer um programa sozinha, em que falo como quero, o que quero, conto as minhas férias, conto como foi o natal, conto o que cozinhei ao jantar, e deixar esse registo para aprender a partilhar o espaço com outra pessoa não me sai naturalmente. é preciso saber dar espaço ao outro.

no ano passado, quando o mercado de tv mexeu ficou à espera que o telefone tocasse para mudar de canal?

não! tenho um contrato de exclusividade com a tvi, e não estou interessada em mudar. o que é que eu iria fazer para a sic ou para a rtp? quantos apresentadores é que eles têm? na sic, só no fama show são cinco apresentadoras. obviamente que me sinto muito mais preciosa na tvi do que noutra estação. não faria sentido mudar.

apesar do contrato, não vive numa certa ansiedade?

confio no meu trabalho e acredito que vou ficar muitos anos na televisão. mas se um dia acabar, não vou ficar a chorar com o meu ego em baixo, por precisar do público. se for dispensada, vejo-me a fazer 500 outras coisas. mas é verdade que tenho o talento de estar à vontade e ter empatia com o público.

está sempre a falar do público.

tenho como objectivo entreter as pessoas. e a minha missão é nunca desistir disso.

francisca.seabra@sol.pt