a deposição de mubarak abriu uma porta no egipto: a da
democracia, cujas bases têm sido edificadas lentamente e com pés de barro, com
o receio de quais serão as reacções nas ruas e de como deve ser governado um
país que, nos últimos 40 anos, tinha apenas conhecido o punho de ferro de um
ditador.
em março, foi dado o primeiro passo. as primeiras eleições
legislativas livres deram a vitória e a maioria aos islamitas nos 508 lugares
do parlamento no cairo, capital do país. o seu mandato, porém, durou pouco mais
de quatro meses, quando a 15 de junho o conselho geral das forças armadas
(scaf), sob ordem do tribunal constitucional (tc), dissolveu o parlamento
evocando a inconstitucionalidade do sufrágio.
em causa esteve a ocupação ilegal na assembleia de lugares
destinados a candidatos independentes por deputados pertencentes a vários
partidos políticos. uma causa que sustentou a decisão do tc, que assim devolveu
o poder à junta militar do scaf, que governava o egipto desde a deposição de
mubarak.
em junho, seguiu-se outro passo histórico no país. os
egípcios regressaram às urnas para escolher, numa inédita eleição democrática, o
seu próximo presidente. a vitória caiu nos ombros de mohamed morsi, candidato
da irmandade muçulmana, que ontem deu indícios de querer restaurar o poder
legislativo ao parlamento eleito em março.
porém, esta terça-feira, o el país noticiou um comunicado
divulgado pelo tc egípcio, que sublinhou a sua decisão de dissolver o
parlamento como «vinculativa para todas as instituições do país», erguendo
assim um muro onde a intenção de morsi colidiu, e dificilmente ultrapassará.
por seu lado, e quiçá procurando evitar um descontentamento
nas ruas, a junta militar emitiu o seu próprio comunicado, onde defendeu ter
agido em conformidade com a lei e com o mandatado pelo tc. a cnn citou o seu
líder, mohamed hussein tantawi, que no sábado realçou que os militares
«cumpriram as obrigações e a promessa que fizeram perante deus e o povo
[egípcio]».
hoje, terça-feira, o parlamento eleito em março voltou a
reunir-se, num encontro que se estendeu apenas por cinco minutos. no rescaldo,
saad el-katatny, o líder eleito, ressalvou de acordo com o the guardian que o
parlamento vai respeitar a lei egípcia. a assembleia só deverá voltar a reunir
quando uma decisão definitiva for tomada. leia-se, quando a poeira erguida pela
colisão entre morsi e o tc/junta militar assentar.
uma poeira que também deverá ser levantada nas ruas do
cairo. em protesto contra a intransigência do tc, a irmandade muçulmana
convocou uma manifestação de um milhão de pessoas para a capital do país,
embora não seja claro se a mobilização vá decorrer hoje ou apenas amanhã, na
quarta-feira.
resta aguardar para ver de mohamed morsi continuará a forçar
o seu braço de ferro com os militares e o mais poderoso tribunal egípcio. para
já, e qualquer que seja a sua decisão, a disputa voltou a reforçar ao país o
que tanto queria evitar na antecâmara das suas primeiras eleições legislativas
e presidenciais como selo democrático: a instabilidade.