Controle-se, mas com limites

Se temos uma aflição, no meio de um jantar de cerimónia, fica muito mal levantarmo-nos a correr? Sebastião Magalhães.

uma pessoa elegante nunca tem realmente aflições: nem fomes devoradoras, nem sono bocejante, nem cólicas lamuriadas, nem suores encharcados, nem pressas corridas. ainda que tenham apetite, cansaços, enxaquecas, calores e frios, alguma urgência. mas tudo tão íntimo, tão calmo, tão controlado, que não se nota de fora. normalmente, as pessoas que trabalham para uma pessoa elegante, talvez por mimetismo, talvez por educação de proximidade, também não padecem de nenhum desses males. frederico o grande, da prússia, pedia sempre ao seu mordomo que fizesse tudo com calma, sobretudo quando tinha pressa.

o que não significa não haver uma vez sem exemplo (no caso de se repetir, há tratamentos, nem que seja psiquiátricos) em que tenhamos de interromper uma reunião formal, talvez até um jantar de cerimónia, por um problema. já agora, façamo-lo com dignidade, quase como se não fosse nada. como se nos ocorresse a necessidade de resolver um problema pelo qual alguém insuportável não estava disposto a esperar, e tivéssemos de o fazer, embora contrariados, naquele exacto momento, fora da mesa, garantindo um regresso rápido, e rezando para que ninguém dê atenção ao contratempo. já sabemos que imperadores e soldados morreram ingloriamente à chuva ou ao sol, em paradas militares, só pelo bom gosto de não darem parte fraca. mas também não se justifica hoje um sacrifício tão desmedido. evitemos pois males maiores, e saiamos da mesa ‘de mansinho’.