Cavaco Silva foi moralizador

Numa altura em que todos os media registam prejuízos, como vê os nascimentos da Bola TV e CMTV?

o surgimento da bola tv e do correio da manhã tv marcam um tempo novo no panorama da comunicação social e, em concreto, do audiovisual.

a realidade do cabo está em mudança profunda. cada vez mais os jovens vêem os canais de séries nas suas tablets e pouco ou nada querem saber das notícias da política interna.

sabe-se há tempos que podem ocorrer alterações nos direitos das transmissões desportivas. a incógnita principal reside no benfica e no que sucederá quando expirar o contrato com a olivedesportos. mas não pode ser ignorada a movimentação gerada pela insatisfação dos clubes pequenos e médios e pela inesperada eleição do presidente da liga.

neste quadro, ganha relevo acrescido a anunciada privatização da rtp. apesar de o cabo e os canais especializados ganharem cada vez mais espaço nas preferências dos espectadores.

é um tempo fascinante. as possibilidades trazidas pelas novas tecnologias abalam as tradicionais estruturas de poder e os respetivos modos de funcionamento.

não será por acaso que os primeiros órgãos de comunicação a lançarem uma tv no cabo são aqueles que têm tido posições liderantes nos respetivos sectores.

pelos exemplos dados ao longo de anos, pode afirmar-se sem grandes hesitações que a bola e o correio da manhã, quando se lançam num projeto, fazem-no de modo fundado e com espírito vencedor. os canais tradicionais de cabo que se cuidem. e se o benfica não chegar a acordo com a olivedesportos, mais mudanças relevantes surgirão nesta área que, hoje em dia, tem tanto poder.

2. as cartas de condução têm novas normas. os portugueses vão conduzir melhor?

portugal continua a ser o país que conheço onde pior se conduz. as mudanças legislativas, nessa matéria, vão-se sucedendo. mas as alterações anunciadas nas normas que regulam a obtenção de carta de condução suscitam, pelo menos, grande perplexidade.

com efeito, renovar a carta aos 30, 35, 40 e por aí adiante, de cinco em cinco anos, não faz qualquer sentido.

quando surgem alterações como estas, era bom que fossem devidamente explicadas. os cidadãos, quando ouvem este tipo de decisões da parte do estado, só conseguem pensar numa motivação: mais dinheiro para os cofres públicos.

em portugal, normalmente, é assim: passa-se do oito ao oitenta sem mais nem menos. até há poucos anos, a carta mantinha-se até à velhice sem nenhuma renovação. depois, passou a ser a partir dos 50 anos – e várias pessoas tiveram de tirar a carta de novo porque desconheciam a nova exigência e deixaram passar o prazo. conheço vários casos.

agora, eis que a obrigação passou a ser de cinco em cinco anos.

entretanto, repito, em portugal continua a conduzir-se muito mal. não é que seja o país onde os condutores são mais loucos… mas não há outro país onde, por exemplo, exista tanto o hábito de se conduzir em baixa velocidade pela esquerda, provocando o desespero de quem quer ultrapassar. e ‘convidando’ a manobras perigosas, como ultrapassagens pela direita.

para mudar esta realidade, as medidas deveriam ser outras. a questão não é só a idade. é muito de habilidade. e há quem não a tenha neste domínio. a condição humana é assim. uns têm jeito para umas matérias, outros para noutras. nos exames de condução, os chumbos não podem ser só pelo código ou em testes escritos. a aptidão para a prática da condução devia ser o mais importante.

3. o que acha da entrevista do presidente da república ao sol? concorda com a ideia da flexibilidade do défice ou de que portugal recuperou a credibilidade lá fora?

o presidente foi positivo, construtivo e elucidativo. não tentou competir com o governo, mas, antes, ajudar portugal.

ser assim, estar assim, falar assim, não diminui um presidente. antes pelo contrário!

o presidente sublinhou a importância da reconquista da credibilidade que temos estado a conseguir. deu especial relevo à política externa, como é compreensível nas funções que exerce.

é muito importante que o chefe do estado moralize o país. foi isso que cavaco silva, manifestamente, quis fazer. não com base em ilusões mas com base no realismo. não se refugiou em frases do politicamente correcto, por exemplo, a propósito das manifestações organizadas. compreensivelmente – se recordarmos o seu discurso de florença – reivindicou autoridade moral e política a propósito das actuais mudanças de rumo na união europeia.

portugal precisa de um presidente da república em grande forma. eu disse-o nos momentos menos bons de há uns tempos. e fico muito satisfeito por constatar que portugal pode ter um chefe do estado que contribua para que os portugueses sintam que, pouco a pouco, a estabilidade positiva pode voltar.

dispensemos todos as teorias dos que querem estimular competição entre órgãos de soberania. já chega de divagações boas para colóquios mas impróprias para a governação dos povos. já chega de tempo perdido. temos mesmo de recuperar.