«nesta zona, temos 200 a 300 apanhadores por dia. há desempregados de longa duração que vêm para aqui apanhar as amêijoas e fazer algum dinheirinho. era ajudante de pastelaria e, como agora estou desempregado, ando a apanhar amêijoa para ter algum dinheirinho também», explica paulo serra, 33 anos, munido de um balde e de uma pá, usada para desenterrar os bivalves, que proliferam no rio que banha a capital.
a praia dos moinhos, em alcochete, é um dos principais locais para a apanha de amêijoa japónica.
além de paulo serra, são às dezenas os mariscadores que, ao início da tarde de quinta-feira, aproveitaram a maré baixa e entraram tejo adentro com a certeza de que, quando a maré subir, sairão com amêijoa, a qual será comprada a dois euros ou dois euros e meio o quilo pelos intermediários.
o alcochetense diz que, em média, quando as condições o permitem, apanha entre cinco e oito quilos por cada ida ao rio. nos dias em que a maré «não dá», traz apenas três a quatro quilos.
paulo serra recorda que, há cerca de uma década, um quilo de amêijoa rendia 12 euros. hoje, «como há muita oferta e bastantes mais apanhadores», o preço baixou drasticamente.
de galochas calçadas, seguimos em direcção a uma apanhadora. pelo meio, vários mariscadores pediram, educadamente, para não serem filmados ou fotografados, com receio das autoridades. não foi o caso de lurdes baía, 48 anos.
«tive um tumor e, enquanto fazia os tratamentos, andei sempre aqui. sou reformada e, como gasto muito dinheiro em medicamentos, dediquei-me à amêijoa. o meu marido, que teve um avc [acidente vascular cerebral], anda ali à frente para ajudar a fazer mais algum dinheirinho. precisamos, pois temos a renda de casa, os remédios são um balúrdio e dedicamo-nos a isto. não apanhamos muito, apanhamos pouco, até sermos agarrados pela polícia», diz, com um sorriso.
a crise, a falta de emprego e as dificuldades financeiras pelas quais os portugueses estão a atravessar, são, no entender da reformada, as principais razões que levam tanta gente a dedicar-se à apanha ilegal de amêijoa no estuário do tejo, inclusive estrangeiros.
«vê-se cada vez mais gente. principalmente desde o ano passado, mas este ano há ainda mais pessoas. não são às dezenas, são às centenas. então debaixo da ponte [vasco da gama], nem se fala».
a maré subia rapidamente e a água chegava aos tornozelos. os mariscadores, às dezenas, iniciavam o percurso de regresso para as margens da praia dos moinhos, carregados com baldes ou sacos, recheados de amêijoa.
muitos outros apanhadores, já percorriam o areal em direcção ao parque de estacionamento, onde, alguns intermediários os aguardavam para fazer o negócio. havia ainda aqueles que descarregavam o «produto» para as malas dos automóveis, ou então prendiam a «carga» à bicicleta e rumavam a casa, até regressarem na próxima maré-baixa, indiferentes aos perigos que as amêijoas representam para a saúde pública.