A saída de Francisco Louçã do BE

A saída de Francisco Louçã não surpreendeu, até porque já era ventilada desde as eleições legislativas do ano passado. Ele levava já muitos anos de liderança política, mesmo antes da criação do Bloco de Esquerda, nomeadamente na LCI.

naturalmente que é bom renovar e francisco louçã tem um estilo muito marcado. frequentemente, ouço pessoas dizerem, ao vê-lo na televisão, que já cansa aquele tom e aquele discurso. para quem não sabe, declaro que fomos colegas de turma no liceu, durante cinco anos. escuso de enaltecer as suas qualidades intelectuais, académicas e políticas, que são reconhecidas.

penso que ele faz bem em tomar a iniciativa de sair. mas já não fará tão bem em querer condicionar a escolha de quem lhe sucede. ele pode dizer que não, mas é manifesto que quer a tal solução bicéfala, mista e já com nomes ‘alvitrados’. compreendo a sua ideia de renovar os métodos, as regras e as ideias na forma de fazer política. inovou-se na medicina, na astrologia, na física, na comunicação, em todas as áreas do saber. o que continua na mesma? o subsistema político!

por isso mesmo, a proposta de francisco louçã, de alterar o modo de liderança, tem lógica. ou antes, é compreensível. só que o facto de aparecerem logo os nomes para essa inovação, no caso catarina martins e joão semedo, dá à proposta um certo sabor de estratagema para conseguir o tal condicionamento da sucessão. era mais bonito louçã defender essa inovação e dizer que não se envolvia na escolha de nomes. aliás, penso que deve ser assim, sempre: quem sai deve dar liberdade a quem fica, para escolher os responsáveis pelo tempo que venha a seguir.

tempo de transição nos açores

a propósito de longevidade no exercício do poder, ocorrerá daqui a dois meses a saída de carlos césar da liderança do governo regional dos açores. são 16 anos, que se seguiram ao tempo marcado pela liderança de mota amaral. ou seja, o psd governou cerca de 20 anos e o ps 16.

quando mota amaral saiu, o psd governou mais um ano, mas, nas eleições seguintes, o ps ganhou. e agora que sai carlos césar, será que ganha o psd? tudo parece indicar que sim! são os ciclos da alternância que, em sociedades mais pequenas e mais fechadas, como nos açores, são mais duradouros. claro que existe a madeira, verdadeiro caso à parte, e onde a distinção fundamental, em relação aos açores, nesta matéria, parece ser uma, muito simples: quem está na liderança, até hoje, nunca saiu. significa isso que, se alberto joão jardim tivesse deixado a liderança do governo regional da madeira, o psd teria perdido o poder ou teria passado para a oposição? não acredito, porque o ppd-psd é um partido mais implantado nos tecidos da sociedade madeirense do que o é nos açores. haverá mais razões, mas não é este o espaço para as desenvolver.

berta cabral, candidata do psd açores, é uma mulher com capacidade de liderança e com personalidade vincada. tem também muitos anos de exercício do poder, na relevante câmara de ponta delgada. esse exercício de poder autárquico gerou-lhe muitos apoiantes, mas também, como é óbvio, alguns opositores. o candidato do ps, vasco cordeiro, por sua vez, aparece muito pela mão de carlos césar. é a mesma questão da sucessão de francisco louçã, por muito injusta que possa ser a comparação.

tudo parece, pois, indicar que, nos açores, chegou outra vez a hora da alternância.

marcelo e a remodelação governamental

cordialmente, discordo em absoluto da tese de remodelação defendida por marcelo rebelo de sousa, há duas semanas, na tvi.

os dossiês da governação, num momento como este que o país atravessa, são ainda mais complexos do que o normal. há negociações com entidades externas, há negociações e renegociações com instituições nacionais, situação que não é compaginável com uma mudança de titulares de ministérios. por exemplo, estão em curso a reestruturação do subsector dos transportes, as privatizações, a renegociação das ppp, e isto só no ministério da economia.

nos contactos que mantenho, na minha vida profissional, com entidades que têm ou podem vir a ter investimentos em portugal, recolho a firme convicção de que os horroriza a simples hipótese de mudança de governantes, numa altura como esta. cada ministro pode ter melhor ou pior imagem pública e a estrutura do governo pode ter prós e contras. mas essa estrutura é a que o primeiro-ministro escolheu e há que trabalhar com ela. como aqui escrevi há uma semana, importa manter a rota, sem dogmatismos, mas com determinação.