o caso português reuniu destaque não por ser novidade, mas
por ter sido o primeiro desta onda mais recente – este ano, os gregos tinham-se
já unido em duas greves gerais e outros inúmeros protestos.
a 15 de setembro, porém, a manifestação anti-‘troika’ (fmi,
bce e eu), organizada através das redes sociais e sem qualquer logística
sindical, atirou milhares para a rua. em lisboa falou-se em 500 mil pessoas,
espalhadas entre cartazes, gritos e cânticos e com um ‘cerco’ improvisado ao
edifício-sede do fmi.
no porto foram mais de 100 mil, e outras dezenas de
milhar em mais de 20 cidades do país. a mensagem era comum: os portugueses
estão fartos de austeridade e uniram-se para o mostrar ao governo. ao todo,
apenas uma pessoa detida na capital.
o mesmo movimento que convocou esse protesto anunciou já um
outro, para 13 de outubro. o seu nome carrega a mensagem da manifestação: ‘que
se lixe a troika!’.
dias antes, o executivo, pelas vozes de passos coelho,
primeiro-ministro, e vítor gaspar, ministro das finanças, anunciara um novo
reforço da austeridade, encabeçado pelas alterações à taxa social única, a
famosa tsu para qual as contribuições dos trabalhadores passariam de 11 para
18%, e a das empresas de 23,75% para 18%.
entretanto, o governo abandonou a proposta. o protesto
ganhou força com as críticas que nos dias seguintes ecoaram pela imprensa,
vindas em força da oposição e de membros do próprio psd. até paulo portas, cara
do cds e parceiro de coligação de passos, denunciou a tsu. hoje discutem-se
alternativas, enquanto já espreita um novo protesto, este sábado, convocado
pela cgtp.
madrid, segundo round
em matéria de crise, é comum ouvir-se e ler-se que os países em
dificuldades andam uns atrás dos outros, em termos de evolução.
diz-se que portugal está um par de anos (ou menos) atrasado
em relação à grécia, e que os espanhóis perseguem os portugueses a um ano de
distância – tudo depende dos números das dívidas, défices, desemprego e por aí
fora. falando em protesto, espanha teve uma semana para digerir os ecos que
vinham de portugal.
na terça-feira, a digestão já estava feita: mais de 6 mil
pessoas respondiam ao apelo do grupo 25-s (25 de setembro), e atiravam-se para
as ruas de madrid, onde o objectivo era cercar o edifício do parlamento do país
e pedir a demissão do governo, liderado pelo conservador mariano rajoy.
ao final do dia, os espanhóis ultrapassavam portugal num
ponto – na violência. o saldo ficou-se nos 64 feridos e 35 pessoas detidas, com
as imagens a mostrarem confrontos entre polícia e manifestantes, fogos ateados
e mais de 260 quilos de pedras arremessadas. para ontem foram convocados novos
protestos, uma insistência que não teve o mesmo ímpeto: viram-se menos pessoas
(cerca de 2 mil), menos polícias (180, foram mais de 1300 na terça-feira) e,
sobretudo, muito menos violência no centro de madrid.
em causa estavam as iminentes novas medidas de austeridade –
que o executivo discutia no interior do edifício -, numa altura em que a
espanha já atingiu uma taxa de desemprego de 26,4% e é cada vez mais
pressionada a oficializar um pedido de resgate externo, que se estima que
rondará os 100 mil milhões de euros.
o governo resiste, temendo a vinda de uma ‘troika’ tão ou
mais exigente como a que entrou em portugal e na grécia. por dentro, o
executivo treme face aos resgates que, por sua vez, tem de prestar a várias
regiões – hoje foi castilla-la mancha a acudir ao fundo de liquidez autonómico
(fla), subindo para cinco o número de pedidos de auxílio.
o objectivo é reduzir o défice para os 4,5% do pib até 2014,
obrigando a cortes e medidas que permitam a que espanha poupe 21 mil milhões de
euros. o governo de rajoy vai hoje anunciar o orçamento do estado para 2013.
queda grega continua
também ontem os gregos uniram-se pela primeira vez numa greve geral contra
o governo de coligação de antonis samaras, eleito em junho. o país prossegue a
sua queda num abismo que do qual já poucos esperam que saia, mas onde o fundo
continua a não chegar.
os dados do executivo estimaram em cerca de 30 mil os
manifestantes que terão estado reunidos em atenas, num protesto que a união
sindical do país, a adedy, diz terem estado mais de 100 mil gregos. a praça
syntagma, diante do parlamento, voltou a encher-se, e a violência reapareceu
também.
um grupo de encapuzados, uma minoria, lançou
concktails-molotov contra a polícia – mais de 3 mil agentes estiveram na
capital, o dobro do normal -, ateando várias chamas e obrigando as autoridades
a recorrem ao gás lacrimogéneo, ignorando ordens para não utilizarem químicos
para combater os protestos.
a manifestação fora convocada como mais um gesto de protesto
contra, claro, novas medidas de austeridade para o país. o governo de samaras
tem que aplicar mais 11,5 mil milhões de euros em cortes e aumentar em outros 2
mil milhões os já pesados impostos.
tudo para respeitar as exigências da ‘troika’, com qual
estará ainda a negociar uma extensão de quatro anos do prazo de cumprimento do
programa de ajustamento idealizado para a crise helénica. em 2011, o país tinha
já conseguido um perdão de mais de metade da sua dívida externa.
de acordo com a versão inglesa do diário kathimerini, até a nova democracia e o
pasok, em respectivo o partido do primeiro-ministro e o seu parceiro de
coligação, terão em conjunto uma dívida aos bancos gregos superior a 200
milhões de euros. para este ano, a comissão europeia prevê que a economia grega
encolha 4,7%, segundo a bbc.
lisboa, madrid e atenas não tardarão a assistir a novas
manifestações, novos focos de um protesto que cada vez mais atira um nome para
o mau-olhado das suas populações – a ‘troika’, que hoje não se consegue desatar
do nó que tem com a austeridade. um nó que nenhum governo tem conseguido
desatar.