Recuo do Governo

A abertura do Governo para afastar as medidas sobre a TSU é um acto de inteligência e de sensibilidade.

o que tinha sido apresentado constituía a ‘gota de água’ que, em certa medida, ‘fez extravasar o copo’.

as pessoas estavam, e estão, preparadas para sacrifícios. mas começaram a sentir-se inquietas com os resultados da execução orçamental do primeiro semestre. aí, foi o despertar das dúvidas de que valesse a pena tudo aquilo que têm passado.

não adianta ‘chover mais no molhado’. a modulação exposta quanto às medidas sobre as contribuições da segurança social despoletaram oposição generalizada num clima de grande inquietação social. provocou a agitação política que se conhece. o país precisa de concertação social, da paz social que seja possível. o país precisa de um governo tão estável quanto seja, também, possível.

assim sendo, pôr de lado esse propósito é um acto de inteligência política e de sensibilidade social.

refira-se, a propósito, o sentido de responsabilidade demonstrado pela ugt e por joão proença. constitui um activo valiosíssimo de portugal, no tempo que vivemos.

a cip e a descida da tsu

acip disse sempre que discordava desta configuração em concreto. mas confesso que impressionou, negativamente, que vários sectores empresariais se tivessem envolvido no coro radical de contestação dizendo que a redução da tsu não traria vantagens para as empresas. alguns chegaram mesmo a afirmar que devolveriam o dinheiro do aumento – ou da poupança – das contribuições aos trabalhadores.

ora, é incontestável que a redução dos encargos com a segurança social alivia sempre – por pouco que seja – a tesouraria das empresas. é igualmente conhecido que as confederações empresariais, e a generalidade dos proprietários ou gestores de empresas, sempre reclamaram a atenuação desses encargos sociais. terem falado, nestas semanas, como se lhes fosse indiferente, não pareceu muito apropriado nem muito esclarecedor.

a cip vem agora propor alternativas ao aumento das contribuições dos trabalhadores, sublinhando a importância de ser mantida a parte da redução dos descontos das empresas. é assim que deveria ter sido feito por todos. como aqui lembrei na passada semana – antes do conselho de estado e da confirmação do afastamento da versão anterior da medida – importava encontrar alternativas.

em 2009, empresários e a universidade nova falavam no aumento do iva. agora, voltou a ser falado o irs. agora o cds já voltou a admitir impostos.

o problema é que o dinheiro terá sempre de ser encontrado – questão que, durante a crise, ficou entre parêntesis.

o conselho de estado

antes do mais, devo repetir o que escrevi na passada semana sobre esta reunião: ela já estava prevista – e com a presença do ministro das finanças – antes do anúncio das contestadas medidas sobre a tsu.

em segundo lugar, é bom sublinhar – para os menos próximos destas matérias – que o presidente não convocou o ministro das finanças, antes acertou com o primeiro-ministro a sua presença. se fosse de outro modo, seria muito grave, representando uma metamorfose considerável do nosso semipresidencialismo.

em terceiro lugar, gostaria de sublinhar que esta foia reunião do conselho de estado em que aquele órgão mais se assemelhou – na sua função – ao que, há muitos anos, defendo: um senado, uma câmara alta. numa reportagem televisiva, cheguei a ouvir designar o conselho como mini-senado… está mais perto!

a convocatória da reunião, neste contexto, foi arriscada mas acabou por ter um papel construtivo. aliás, cabe reconhecer o trabalho do presidente da república ao longo destes dias. independentemente da agitação de algumas pessoas que lhe são próximas, a acção conhecida de cavaco silva esteve à altura do que se espera de um chefe do estado em tempos como estes.

que allternativas à tsu?

acomissão europeia já disse que têm de atingir-se os mesmos objectivos «quantitativos e qualitativos» que teria a tsu. ora, não será difícil encontrar uma solução que agrade aos sindicatos, aos patrões, à troika e ao tribunal constitucional?

as soluções alternativas têm de ser equitativas entre os sectores público e privado, devem ser progressivas, ou seja, variar em função do rendimento (o que afasta o iva), devem ser moralmente justas, exigindo esforços acrescidos aos detentores de fortunas e de bens de luxo.

o quadro em que devem surgir não podem perder de vista duas referências básicas:

a) o estado tem de reduzir mais a sua dimensão e muito mais as suas despesas de funcionamento;

b) a economia portuguesa tem de crescer e a sociedade espera ansiosamente o anúncio de medidas que apontem esse rumo.

passados estes dias de agitação, temos de recuperar a linha de orientação que nos aproxima da irlanda e afasta da grécia (fazendo votos pela recuperação, tão rápida quanto possível, da economia grega).

passados estes dias de desorientação, importa voltar a uma rota firme. uma rota firme, mesmo com a correcção que se mostrou necessária.