essa ligação especial data da própria independência e foi uma política neocolonial inaugurada pelo general de gaulle, o ‘realista conservador’ que pôs termo ao império francês. a concessão da independência ser acompanhada por tratados de cooperação que, além da soberania formal dos novos estados – bandeira, hino, presidente, assento nas nações unidas – garantiam a paris uma presença cultural e económica, apoiada por estruturas político-militares e securitárias bilaterais.
o sistema funcionou. chefes de estado como senghor e houphouët-boigny tinham profundas ligações com a metrópole francesa, onde tinham casado e exercido importantes cargos políticos. senghor e sobretudo houphouët-boigny foram aliados incondicionais da frança na manutenção do status quo nos regimes pró-ocidentais e na desestabilização dos regimes hostis como o gana de nkrumah ou a guiné conacri de sekou touré. ou na guerra civil do biafra. jacques foccart, o famoso ‘senhor áfrica’ de de gaulle, pompidou e giscard, encarregou-se dessa ligação e também de providenciar formas superiores de luta, quando necessárias.
a françafrique nasceu e funcionou a partir destas alianças. quando os dirigentes locais se desviavam do bom caminho paris actuava. através de um aliado local ou por intervenção militar directa. para isso dispunha de um sistema de bases militares na costa do marfim, no níger e no daomé (hoje benim). a integração financeira e económica na área cfo garantia os interesses das companhias petrolíferas e mineiras. e os políticos da francofonia tinham o seu pied-à-terre e bom acolhimento em paris.
com o fim da guerra fria, com a integração da frança na união europeia, com as exigências de democraticidade e as denúncias da corrupção, dos ‘bens ilicitamente adquiridos’ e da promiscuidade das redes e serviços paralelos o sistema tornou-se insuportável.
os recursos militares também baixaram significativamente: os 30.000 militares francês na áfrica de 1960, passaram a 11.000 em 2006 e a 5.000 em 2009. hoje restam 2.900 em djibuti, 1.150 em dacar e 800 no gabão. mas ainda foi a intervenção das forças especiais francesas que terminou com o empate entre gbagbo e ouattara em abidjan.
hollande anunciou oficialmente o fim deste modelo em kinshasa. coincidiu com o ocidente e a união africana estarem a braços com os fundamentalistas no mali e a prepararem, no quadro das nações unidas uma intervenção, que ninguém sabe quem vai pagar e com que tropas vai ser feita.
no tempo da françafrique, ao menos, não aconteciam destas surpresas.