há quem seja pesado na balança da cozinha do hospital, porque tem mais de 200 quilos. e há quem faça radiografias no jardim zoológico, porque as máquinas tradicionais são pequenas para tanta gordura. «os doentes chegam à consulta com um problema que só pode ser resolvido com cirurgia», conta maria joão sousa e brito, psicóloga clínica especialista em perturbações de comportamento alimentar, para quem o percurso até à obesidade mórbida poderia ser travado.
«é um longo caminho, de cerca de 60 quilos, em que tudo poderia acontecer. até porque, na maioria dos casos, as pessoas que engordaram demais já foram alertadas para níveis elevados de colesterol ou risco de diabetes pelo médico de família». é aqui que entra em acção o novo site k.o. obesidade, na fase em que o obeso ou mesmo quem sofre de excesso de peso «se desleixa ou sente mais deprimido». ou seja, antes de cair no abismo.
provocador – «acha que um homem deveria amá-la com a barriga de fora e as pernas largas? deveria, mas isso não vai acontecer. não à partida…», escreve a psicóloga clínica – e frontal – «tem a motivação necessária para começar a perder peso?», lê-se também no site –, k.o. obesidade (www.koobesidade.com) obriga os doentes a tentar perceber o que realmente lhes traz sofrimento. «é preciso saber quais são as verdadeiras razões das suas ansiedades e angústias e encontrar outras soluções para resolvê-las, sem que seja a comida a funcionar como um calmante ou um anti-depressivo», explica maria joão sousa e brito.
porém, a psicóloga clínica não dá falsas esperanças. se quem acede ao site pensa que vai ouvir «coisas maravilhosas», então o melhor é desistir antes de navegar. «houve uma leitora que me escreveu a dizer que esperava ‘mais colinho’. há obesos que estão à espera que os desculpabilizemos, falam em razões genéticas, socioeconómicas, etc. mas se não os fizermos sentir desconfortáveis, nunca vão querer mudar».
ainda assim, o trabalho de maria joão sousa e brito passa por dar o que chama «calorias afectivas», mas que distingue da «auto-estima fácil». e refere o exemplo de quem acaba por emagrecer, mas continua sem se sentir atraente: «na minha consulta, vejo mais mulheres do que homens. e muitas questionam-se se o corpo afecta a relação com o outro. afecta, claro! mas não é por perder peso que se vai tornar uma pessoa mais interessante. o trabalho é muito maior do que isso».
para a psicóloga clínica, do serviço de endocrinologia do hospital santa maria, em lisboa, a terapia é, nestes casos, para a vida. porque quem gosta de comer já sabe que cortar no açúcar e na gordura ajuda a emagrecer, mas tem sempre grande dificuldade em «recuperar a graça» de outros tempos.
«os obesos sabem os planos alimentares de cor, mas a solução não está em ficar-se magro, porque não é isso que levará alguém a ser promovido no trabalho ou a envolver-se numa relação. é preciso muito mais». para maria joão, é neste «processo de crescimento» que o psicólogo pode interferir.