Lajes: Saída de americanos gera apreensão quanto ao futuro da ilha

A redução do contingente norte-americano das Lajes, Açores, em mais de 400 militares e 500 familiares a partir de 2014, está a gerar apreensão quanto ao futuro pelo “brutal” impacto na economia local.

no concelho da praia da vitória, o mais próximo da base das lajes e onde ainda existem 318 casas alugadas a norte-americanos, os cortes representam uma redução entre 30 e 40 por cento do produto interno bruto (pib) do concelho, 10 a 12 por cento do pib da ilha, o que, segundo o presidente da câmara, roberto monteiro (ps), “terá um efeito indirecto sobre a economia de menos 50 milhões de euros por ano”, num concelho com 25 mil habitantes e numa ilha habitada por 60 mil pessoas.

números que ainda se avolumam quando se fala em vencimentos directos e indirectos ou nos valores da contratação de empresas locais para prestarem serviços na base.

“estamos a falar de investimentos de 100 milhões de euros na ilha terceira”, nas contas do presidente da câmara de comércio de angra do heroísmo, sandro paim.

no mesmo sentido, a presidente do município de angra do heroísmo, sofia couto (ps), o maior concelho da ilha, não tem dúvidas: “preocupa-me em primeira análise os despedimentos, tratando-se de uma ilha, de um espaço fechado”.

“se compararmos com a região de lisboa, proporcionalmente equivale a termos de uma assentada 14.500 pessoas a serem despedidas, este impacto é muito grande e estamos a falar de despedimentos directos. e quando falamos de toda a economia gerada pelas casas arrendadas, no que consomem no comércio local, a situação agrava-se ainda mais”, afirmou a autarca.

nas ruas com lojas abertas no concelho da praia da vitória, são visíveis os impactos da crise com os estabelecimentos praticamente vazios, existindo também muitos outros espaços para arrendar. nos cafés e restaurantes são poucos os clientes. à crise económica junta-se agora a saída dos norte-americanos.

“há muito menos gente, esta oficina [barbearia] trabalhava com muitos americanos, com a tropa americana, mas desde há um ano para cá que estão cada vez mais a reduzir [a vinda à cidade]”, relatou josé rocha, barbeiro há 47 anos.

“também tive casas arrendadas [americanos] e eles eram exigentes” e com isso davam trabalho a electricistas, canalizadores, jardineiros, contratavam as mulheres-a-dias, conta.

maria joão vieira, 72 anos, trabalhou para os americanos como empregada doméstica e ‘baby-sitter’ durante 38 anos.

o pai morreu no mar e aos 13 anos viu-se obrigada a “ingressar” no trabalho em casa de militares americanos onde limpava, arrumava a casa e tomava conta das crianças.

“trabalhava seis dias por semana por 420 escudos [2,10 euros] por mês, mas pagavam bem. os portugueses pagavam mal, 40 escudos [20 cêntimos] por mês de trabalho. cheguei a tomar conta de um casal com sete filhos, o mais novo de dois anos e o mais velho 13, [outros tinham] três, quatro, dois, tinha sempre crianças”, lembrou.

a saída das famílias não permitirá o emprego de mais mulheres para estas funções.

“aqui a lavoura é que está a dar alguma coisa, não vejo fábricas, não vejo nada que possa aguentar isto, não vejo nada, depois o comércio expandiu-se demais, com lojas e mais de tudo e é como vocês vêem, está tudo vazio”, lamentou ainda josé rocha.

já para luís bettencourt, comerciante no mercado municipal, “é pena que eles saiam, mas se realmente vão sair que saiam de vez e dêem lugar a outros, porque estar só a ocupar o espaço sem dar contrapartidas nem gerar negócios nem riqueza, que fique o espaço livre para alguém que nos compense em condições”.

para vítor silva, da união dos sindicatos, no total haverá uma perda de cerca de 1.000 postos de trabalho (500 directos e outros 500 indirectos), considerando que não há capacidade no mercado interno de absorver estas pessoas.

as empresas locais têm contratos com os americanos nas áreas alimentares, de bebidas, jardinagem e manutenção de espaços verdes, informática, material de escritório e construção civil.

andreia cardoso é empresária do ramo da construção civil, presta serviços para os americanos e disse à lusa que “toda a economia [da ilha] se vai ressentir porque o leque de empresas [que prestam lá serviços] é muito variado”.

lusa/sol