Consoada para todos

Há quem não passe sem o peru e quem não prescinda do seitan, depois há os crentes no açúcar e os fiéis da agave. Mas todos se podem sentar à mesma mesa este Natal. Fomos ao Instituto Macrobiótico e para a cozinha de Justa Nobre aprender receitas para todos os palatos

de um lado creme de castanhas, do outro o aveludado de couve-flor e coentros. será que vamos conseguir distinguir a sopa que leva o caldo de frango? a resposta é sim, mas também não somos fundamentalistas. marco fonseca lidera o workshop de comida macrobiótica e apresenta-nos uma receita que agrada a todos os gostos. nem se desconfia que é macrobiótica até sabermos que a sopa de castanhas, além das ditas, com cebola, abóbora, azeite e sal, leva wakame e shoyu. mas vamos por partes. «wakame é uma macroalga que ajuda a que a castanha seja mais digerível. e o shoyu é molho de soja para cortar o doce da abóbora e das castanhas», explica. até aqui tudo bem. azeite, cebola e wakame para a panela, depois os outros ingredientes e vai tudo a cozer. também justa nobre tem um segredo para a sua sopa de couve-flor ser menos indigesta: «é só escaldá-la!», diz enquanto faz o procedimento. para esta sopa, já há umas batatinhas, alho, leite – para se conseguir textura aveludada – e caldo de carne. no final, coentros passados pela varinha mágica.

avançamos para o segundo prato. peito de galo de campo com vermute e puré de castanhas (lá está, mais uma semelhança) versus empadão de millet com seitan. desta vez, a receita macrobiótica começa com uma agradável surpresa para os petisqueiros: uma maionese que leva limão, manjericão e mostarda. e que além de ser maionese também é um apetitoso molho de entrada. só não leva nem ovos nem natas. estes ingredientes foram substituídos por leite de soja e ainda foram introduzidos óleo de grainha de uva e vinagre de ameixa. o primeiro substitui o óleo normal, o segundo dá acidez à ‘maionese’.

a parada está alta mas justa nobre chega com os peitos de galo de campo com muito ‘boa cara’. começamos a mariná-los: sumo de laranja, um copo de vermute, tomilho, alho, sal… enquanto a marinada faz o seu trabalho, prosseguimos com o empadão de millet. para o recheio: cebola, seitan, shitake fresco (espécie de cogumelo), leite de aveia, azeite, shoyu, tomilho e kuzu. kuzu? «é amido da raiz da planta pueraria lobata originária do sul da américa e de alguns lugares mais altos do japão». indicações: para problemas digestivos, além de engrossar sopas e molhos, esclarece marco. vai tudo para a panela e, à parte, o millet: «cereal por excelência para tratar problemas de estômago e pâncreas, ajuda a aumentar a vitalidade e a lidar com o clima frio», adianta o especialista.

os peitos de galo também já estão prontos para a frigideira. embora com indicações terapêuticas menos claras, o seu cheirinho promete fazer bem à alma.

dourados que estão vão para o forno. o molho que ficou na frigideira é para ser engrossado com farinha maizena (a versão não macrobiótica do kuzu) e mais caldo de galinha. no final, os peitos juntam-se com o molho num prato que já tem o puré de castanhas à sua espera. quanto ao millet vai para um tabuleiro com o _seu recheio e por cima leva a ‘famosa’ maionese. depois de uma breve passagem pelo forno chega também à mesa com óptimo ar.

e será que ainda há estômago para a sobremesa? marco apresenta-nos duas e ainda por cima de peso: bolo-rei e sonhos, tudo macrobiótico. justa ‘fica-se’ por uma iguaria da sua terra transmontana: cuscos. «há por aí muitos cuscos», brinca enquanto explica que é uma massa miudinha feita à base de trigo barbela. como a sua receita é menos complexa, avançamos com ela. num tacho, leite a ferver; põe-se lá dentro os cuscos e deixa-se cozer, a seguir junta-se baunilha, casca de limão, pau de canela e açúcar; depois juntam-se as gemas e deixa-se engrossar. servem-se em tacinhas polvilhadas com canela. quanto ao bolo rei e aos sonhos macrobióticos, deixamos as receitas para os corajosos, com votos de bom natal.

patricia.cintra@sol.pt