«começámos a trabalhar com o joaquim a 1 de outubro._ele esteve até à primeira semana de novembro a ensaiar, altura em que foi hospitalizado._nós continuámos o trabalho que ele tinha começado, com as suas notas de encenação» – explica ao sol rodrigo_francisco, actual director da companhia, que acompanhou, e continuou, o trabalho de encenação.
mas este não é um projecto com apenas dois meses._há quatro anos que joaquim_benite queria levar_timão de atenas à cena em portugal. «o_joaquim tinha feito, em 2008, uma adaptação do timão de atenas no_festival de mérida._mas não estava satisfeito, ficou com vontade de fazer a peça integral._e na noite da estreia convidou o_luís vicente para fazer o texto integral aqui em_almada».
a peça esteve marcada para 2011 e foi adiada, devido à doença de benite (que teve complicações hospitalares depois de uma operação a um aneurisma na aorta). agora, timão de atenas chega finalmente ao palco._«é a estreia absoluta em portugal. e publicámos a fabulosa tradução que yvette k. centeno fez do texto, um dos pontos altos do espectáculo», diz rodrigo_francisco.
a peça (que se julga ter sido escrita por shakespeare middleton) versa sobre timão, um rico ateniense, homem generoso, que se vê rodeado de amigos. até ao dia em que perde a fortuna e que descobre que os amigos que julgava ter o rodeavam apenas devido ao dinheiro._é à sua queda que vamos assistir ao longo do espectáculo – uma queda que é, também, a de atenas.
«o que tem interessado neste texto encenadores como joaquim_benite ou_peter_brook, que o fez em 74, é a sua poesia. é um texto desgarrado, com cenas que parecem não estar acabadas. o que emana do texto é a profunda poesia de shakespeare e a sua capacidade de tornar as ideias muito claras», avança rodrigo_francisco, que salienta, nesta encenação de benite, o olhar do encenador sobre a alienação na sociedade. e explica: «quando timão está à procura de raízes na floresta e encontra ouro diz: ‘mas o ouro não serve de nada, não o posso comer’. é uma coisa evidente, mas que temos tendência a esquecer: o ouro, em si mesmo, não tem valor nenhum, apenas o que lhe atribuímos por convenção. tal como o dinheiro, o papel-moeda, não tem qualquer valor em si mesmo. uma sociedade que valoriza o ouro, valoriza o vazio. hoje, já nem ouro existe._a nossa sociedade rege-se por regras económicas de transacção de valores que não têm existência física. que caminho pode levar uma sociedade que em vez de valorizar o amor e a arte valoriza o ouro? está-se a caminhar para o vazio».
no fim, já nem ouro resta. apenas o sangue. benite teria ficado feliz.