o sempre ‘papagaio’ do soarismo dizia mesmo que os pontos em aberto nem sequer eram detalhes, eram ‘disfarces’; porque tudo estaria mais do que resolvido. será que não sabem pedir desculpa?
sabemos todos que humildade é um ‘bem’ que não existe nesses seres, mas de vez em quando poderiam dar um ar da sua graça.
como muitos reconheceram, esta poderia ter sido uma solução positiva, designadamente, para o ganho de rotas da tap na américa latina e noutras paragens estratégicas.
teria vantagens, também, para a deficitária empresa de manutenção que a tap detém no brasil. mas o governo entendeu que não estavam preenchidas todas as condições que lhe dessem a segurança na decisão.
todos pensavam que o governo não teria margem para dizer ‘não’ ao prazo previsto no memorando da troika. mas disse. e, por isso mesmo, independentemente da posição de cada um sobre o assunto, a notícia caiu bem na generalidade dos sectores.
o facto de a privatização da tap se ter iniciado antes da privatização da ana não foi bom. e agora, a existência de vários candidatos à ana ligados aos aeroportos de importantes cidades (algumas, capitais europeias) poderá ajudar a que surjam propostas muito significativas.
é bom ter presente que companhias de bandeira de outros países tiveram, também, de atravessar processos complexos para ultrapassar situações idênticas à que a tap enfrenta. exemplo mais próximo é o da ibéria, que se associou com a british airways depois de ter avaliado várias outras opções estratégicas.
recordemos, ainda, o que se passou com a varig, com a sabena, com a própria swissair, para além, entre outras, de companhias norte-americanas como a pan american airways. faliram, desapareceram. e se a bélgica (país de que a sabena era companhia de bandeira) tem problemas de identidade nacional!
a tap precisa de ser fortemente capitalizada. a sua administração está em gestão desde há um ano. a nova fase da privatização será desenhada, seguramente, de modo célere. a dívida da empresa precisa de ser reestruturada, a frota de ser renovada, a estratégia para os próximos anos carece de ser aclarada.
para um país como portugal, que tem uma diáspora tão significativa, uma vocação ecuménica tão acentuada – e, noutro plano, um peso tão significativo do sector turístico na economia –, é importante assegurar alguma posição na tap. as golden shares foram postas em causa, mas há direitos especiais que podem ser compreendidos pelas autoridades da união europeia. é para assuntos como este que é importante um país ter um nacional seu como presidente da comissão europeia. obviamente que está obrigado a cumprir as normas vigentes, mas existe sempre a liberdade contratual que bem conhecem os grandes países da união.
em 2004, enquanto primeiro-ministro, tive de tomar uma decisão difícil, com antónio mexia, então ministro dos transportes.
antónio cardoso e cunha era o ‘chairman’, e fernando pinto o presidente executivo. como era público na altura, existiam entre os dois diferenças de opinião quanto à gestão da tap.
na prática, eram ‘dois comandantes para o mesmo avião’. foi custoso mas decidi, com o ministro, pela continuidade de fernando pinto e pela saída de cardoso e cunha. a situação tinha de ser clarificada – e vários motivos concorreram para essa opção, muito apoiada pela generalidade dos profissionais da empresa.
meses antes, em 17 de novembro de 2003, enquanto presidente da câmara municipal de lisboa, eu tinha entregue a chave de honra da cidade (decisão por mim proposta) a cardoso e cunha (e a antónio mega ferreira), pelo trabalho feito na expo-98. tinha e tenho grande consideração por aquele que foi o primeiro comissário português nas comunidades europeias.
cardoso e cunha aceitou a decisão do governo sobre a sua saída da tap, divulgada a 6 de agosto de 2004, em silêncio e com grande dignidade. algum tempo depois, vim a saber que tinha dificuldades graves nas suas empresas pessoais. mas nunca o invocou a ninguém. foi, e é, um ‘senhor’, com ‘s’ maiúsculo.
apesar do comunicado que saiu nesse verão de 2004, enaltecendo as suas elevadas qualidades, eu nunca tinha feito a justiça que hoje lhe faço, dizendo tudo o que aqui fica escrito.
já o admirava, conhecia-o do psd e dos tempos de francisco sá carneiro (de quem foi ministro da agricultura) e de cavaco silva. custou-me muito decidir daquele modo, mas entendi que, na altura, era a melhor decisão para a tap e, portanto, para o país. e o critério só pode ser esse.
são esses critérios – o interesse da tap e, acima de tudo, o interesse nacional – que estou certo serão seguidos pelo actual primeiro-ministro. por isso, o governo decidiu, por ora, não privatizar a tap, tendo em conta a única proposta que chegou a conselho de ministros.