O regresso da geopolítica

No Wall Street Journal, Robert D. Kaplan escreve sobre o equívoco das elites euroamericanas ao darem como garantido e adquirido o triunfo dos grandes princípios ou valores da Ilustração – individualismo, humanitarismo, igualitarismo, internacionalismo, globalização mediática e financeira.

kaplan vê o contrário: o que está a triunfar em todo o mundo são exactamente os valores identitários, da comunidade e do grupo, acompanhados por um renascimento da geopolítica.

um exemplo que cita é a decisão final de dois anos de turbulência no egipto. a aprovação da nova constituição representa o fecho de um pacto de regime entre os irmãos muçulmanos e o exército. após a queda de mubarak, o exército continuou a ser a base do regime e, perante o resultado eleitoral, negociou com a maioria islâmica a transição. o novo presidente, morsi, assumiu os poderes do anterior ‘homem forte’, deixando aos militares uma esfera de poder e privilégio.

a ideia de que a primavera árabe fosse um movimento democrático e individualista era um wishful thinking dos jornalistas e dos comentadores liberais, que geralmente vêem o que gostam de ver, seja o sentir da rua árabe, seja o prof. baptista da silva da onu.

e depois da primavera árabe, escreve kaplan: «(…) um processo análogo está a acontecer na ásia. ali o nacionalismo é jovem e vibrante – como era no ocidente nos séculos xix e xx». na ásia, os governos não pensam em derrubar fronteiras e identidades, preocupam-se com o desenvolvimento económico, a força militar e a balança do poder com vizinhos e rivais: a china e a índia afirmam-se como potências navais no pacífico e no índico, a marinha japonesa tem o quádruplo dos navios de linha da royal navy, as filipinas e o vietname reforçam orçamentos militares. os dirigentes promovem essas políticas e os povos aplaudem-nos.

também uma das razões da popularidade de putin é a sua preocupação de reafirmação da rússia como poder na eurásia. perante esta afirmação e restauração do poder russo, a europa devia pensar e repensar a questão da cintura de estados independentes, que separam a alemanha da rússia, a famosa mitteleuropa, contando com os bálticos, a ucrânia e os estados balcânicos, incluindo a grécia.

a independência destes estados é importante nestes anos decisivos em que a ‘vingança da geografia’ repõe em jogo as realidades do espaço e dos povos no espaço.

entre a rússia e a alemanha, a ucrânia é importante neste regresso da geopolítica. por sua vez, a europa percebeu isso. a partir do momento em que moscovo ofereceu a kiev condições interessantes em termos de fornecimento energético, a troco do regresso à esfera política russa, bruxelas retomou o interesse pelas negociações com a ucrânia, pondo de parte outras preocupações.

é a vingança da geografia.