Por um fio

Na semana passada fiz aqui uma série de previsões. Encaro a actividade de prever o futuro com a descontracção que merece.

não fazemos ideia do que nos vai acontecer e essa é a verdade, sobretudo nesta fase tão complicada em que o país se encontra. nem as estrelas colaboram, mas isso sucede porque não se deixam ver. é como se o país estivesse em suspenso, preso pelo fio frágil das decisões da europa de governantes internacionais e nacionais, que não estão à altura da gravidade dos acontecimentos. não fazendo ideia do que se irá passar amanhã, muito menos ao longo do ano que acaba de começar, resta-me ter esperança de que a vida em portugal não se torne tão dura, difícil, sofrida e mesquinha como nos últimos tempos. as circunstâncias de necessidade trouxeram sofrimento e momentos de desespero. só me resta desejar o melhor possível a todos nós. que a crise não esteja aí para ficar e que não piore o que já não está bem.

museus e crianças

há duas coisas maravilhosas em londres, entre as várias óptimas que a cidade tem para oferecer aos seus habitantes e turistas: os museus e as suas actividades para crianças. as artes são um aspecto fundamental da educação britânica e é de muito pequeno que ali se torce o pepino. há aulas de desenho à vista para miúdos na national portrait gallery e actividades gratuitas para montar esculturas de madeira na tate britain. desta vez, assisti no museu da ciência a uma demonstração sobre bolhas de água destinada a crianças dos três aos seis anos. o encanto foi total, a participação efusiva e os miúdos mais velhos até puderam aprender alguma coisa. a actividade é gratuita num museu de entrada livre, que funciona sobretudo à base de donativos, como passou a acontecer aos museus em inglaterra. além deste financiamento, há os amigos dos museus que os mantêm e as exposições com bilhetes caros. o estado ficou de fora deste assunto.

recuperar o tempo

vale a pena ver a exposição hollywood costume no victoria and albert museum. é como ver de perto e por trás das câmaras um pouco da história do cinema com a sensação ainda mais vívida da espectacularidade dos filmes. as minhas peças de roupa preferidas foram o robe sumptuoso do drácula de coppola, o robe bege miserável do dude, de o grande lebowski, dos coen, e os lendários sapatinhos vermelhos de judy garland, no feiticeiro de oz. parecem enormes para uma menina. há um bónus nesta colecção de luxo. algumas das peças vêm acompanhadas de um habilidoso sistema de vídeo. são dois, às vezes três, ecrãs em que ouvimos e vemos o realizador, os actores e o estilista a falar numa conversa editada e montada que parece natural. ao lado do célebre fato ‘verde nilo’ usado em os pássaros, assistimos, sem tricas nem assédios, a uma conversa civilizada e divertida entre edith head, a estilista, alfred hitchcock e tippi hedren. uma agradável coincidência.

passear de metro

as três novidades marcantes nos transportes públicos neste inverno londrino gelado e chuvoso são a maquilhagem carregada, as unhas de gel em bico e o kindle. na zona de knightsbridge, a maquilhagem é mais ligeira, mas nunca desaparece nem faz por isso, o mesmo felizmente não acontece com as horríveis unhas de gel em bico. o kindle aparece em todo o lado. não sei se a percentagem de leitores no metro e nos autocarros de lisboa é menor do que as dos transportes de londres. não esqueçamos que é uma cidade com seis milhões de habitantes. lêem livros em papel, mas a maioria prefere ler no kindle. o modelo mais usado é o paperwhite. não vi nenhum dos modelos mais baratinhos e práticos de transportar na carteira ou no bolso do casaco. não vi nenhum ipad, nem sequer o ipad mini. o kindle parece assim ocupar um lugar na vida dos habitantes de londres tão naturalmente como os livros em papel. sem nenhum drama.

perdertempo

vi the girl, de julian jarrold. o filme explora a relação de alfred hitchcock com tippi hedren, a actriz principal de os pássaros e marnie. o realizador tem uma obra bastante desinteressante, da qual só me lembro da péssima adaptação de reviver o passado em brideshead. os actores deste seu último filme (gostava que fosse mesmo o seu último filme), como sienna miller e toby jones, têm talento. sobretudo o actor, que nos deu uma boa versão de truman capote noutro filme pseudo-biográfico. digamos que é preciso talento para imitar sem cair muito no ridículo, apesar de haver sempre esse risco e de nunca se conseguir deixar de ser um bocadinho. mas uma história que se baseie na obsessão de um artista e na vulnerabilidade do mais fraco só tem interesse se acabar em crime. neste caso, terminou com a carreira de tippi hedren e com dois grandes filmes de alfred hitchcock. aconselho a esquecermos julian jarrold e o seu the girl.