Sara Prata: ‘O medo faz parte do ser actor’

Todos os dias Sara Prata chega a casa dos portugueses no papel da vilã Patrícia, na novela Louco Amor. Agora está também em cena no Teatro Aberto com Há Muitas Razões Para Querer Ser Bonita, uma peça que fala do peso da beleza.

acabou de estrear a peça ‘há muitas razões para uma pessoa querer ser bonita’, no teatro aberto, uma discussão recorrente nos tempos de hoje.
sim. a peça tem a ver com os juízos de valor que fazemos sobre os outros, muitas vezes sem consciência. são diálogos realistas, que escondem sentimentos, revoltas e frustrações. fala-se de como uma pessoa é bonita e a outra é ‘apenas’ normal. são dois casais, a ana guiomar e o jorge corrula, eu e o tomás alves e eu sou a bonita e sou julgada sem nunca se questionar o que sinto. toda a gente acha que sou feliz porque sou bonita.

há tendência para se esvaziar uma mulher bonita? se é bonita e tem sucesso, tem de ser feliz.
a sociedade nem põe a hipótese que a vida não corra bem a essas pessoas. mas, como digo na peça, ‘ser bonita tem tanto peso como ser feia’.

quais foram as maiores dificuldades que sentiu?
venho do registo da televisão e foi difícil encontrar o peso certo das palavras. sinto a responsabilidade porque há muito tempo que não fazia teatro e trabalhar no teatro aberto, com o joãolourenço, é uma coisa que queria muito. esse peso fez-me ficar mais apreensiva, mas é normal. o medo faz parte do ser actor.

vem da escola profissional de teatro de cascais, mas a verdade é que tem feito pouco teatro. foi uma opção?
tenho, por isso o meu medo. quando terminei o curso fiz três peças no teatro experimental de cascais, mas entretanto sugiram os morangos com açúcar e, a partir daí, tenho estado mais ligada à televisão e acho que tenho de dar primazia à minha ligação à tvi. muitas vezes perguntam-me se não quero ir para o estrangeiro, mas acho que seria injusto não abraçar as oportunidades que o meu país me dá.

na novela louco amor fez a sua primeira vilã. como tem sido a experiência?
muito intensa, foi a primeira vez que fiz este registo de limites ténues entre a sanidade mental e a falta dela. consegui descobrir novos registos em mim e tive oportunidade de ver reacções diferentes no público.

como assim?
foi a primeira vez que tive abordagens menos boas na rua. há dias, num centro comercial, tive uma senhora aos gritos e a ameaçar-me de porrada, pelo que a patrícia tinha acabado de fazer na novela. até agora tive sempre as boazinhas e as cómicas.

este ano foi o fim dos morangos com açúcar. o que guarda dessa experiência?
saudades, boas recordações… para mim terminou de forma engraçada porque, ao fim de seis anos, voltei à minha personagem [a becas] para fazer o filme que marcou o fim da série. tenho muito carinho pela geração morangos. foi uma oportunidade para muitos jovens que estavam a sair das escolas de representação e penso que foi também uma mudança daquilo que era a representação em televisão.

entre 2007 e 2009 esteve parada. como lida com a insegurança na sua área?
o problema é que, no nosso caso, dos actores, além disto ser uma profissão, é uma paixão e preciso de a alimentar. nunca me deixo ficar na inércia, aproveito esses tempos para estudar, mas é muito difícil para um artista ficar em casa. infelizmente, temos muitos actores parados, em casa. para mim é assustador pensar em alguém que tem uma carreira de 30 anos e que continua a viver em insegurança.

pensa no que fará se lhe acontecer o mesmo?
obviamente já pensei nisso, mas seria sofrer por antecipação. preciso de usufruir deste momento em que estou a trabalhar e em que tenho projectos que me satisfazem. mas é triste perceber que muitas pessoas continuam a achar que os artistas são palhaços e que fazemos o que fazemos para nos divertirmos. esta é a nossa profissão.

raquel.carrilho@sol.pt