A loucura instalou-se no Rossio

Basta sair à noite do Teatro Nacional D.Maria II, no Rossio, para encontrar diversas pessoas que por ali dormem, debaixo das arcadas. Uma realidade que muitos preferem ignorar mas que, agora, está também representada dentro do próprio teatro.

condomínio da rua, de nuno costa santos, encenada por joão mota, em cena na sala garrett (até 10 de fevereiro), fala da exclusão social, da pobreza e das patologias psiquiátricas que lhes estão associadas.

joão mota queria levar à cena uma peça que não só olhasse portugal, como falasse dos sem-abrigo, dos ex-combatentes, do amor, da violência doméstica, da loucura, colocando em palco os seis actores que integram o elenco residente do teatro. como queria precisão na criação das personagens, telefonou a daniel sampaio, pedindo-lhe que acompanhasse a construção do texto como consultor de análise comportamental.

faltava-lhe, porém, um dramaturgo. foi o psiquiatra que lhe resolveu o problema, indicando-lhe o nome de nuno costa santos, que não hesitou em aceitar a encomenda, indo logo fazer trabalho de campo. «fui para a rua com a comunidade vida e paz fazer a ronda. ouvi muitas histórias dos sem-abrigo e li muito sobre esta temática. há uma enorme diversidade de situações que os levam ali». uma diversidade que não pode ser reduzida apenas à pobreza. também os actores fizeram pesquisa, indo conhecer aqueles que sofrem de esquizofrenia ou outras patologias. condomínio de rua, quase uma criação conjunta, expõe uma realidade tantas vezes ignorada, confrontando o espectador: ‘eles’ são pessoas iguais a ‘nós’. e os papéis podem-se inverter.

também m-show, de marcantonio del carlo (na sala-estúdio até 3 fevereiro), se aventura, através de um estranho apresentador de um talk-show, nos meandros da sanidade mental – ou ausência dela. a loucura instalou-se no rossio.

rita.s.freire@sol.pt