Mali: soluções tácticas e dificuldades estratégicas

Parece uma actualidade dos tempos dos anos 60, com os soldados franceses naqueles camuflados que lembram os ‘lagartos’ do Bigeard a embarcarem nos Transall: as mochilas e boinas verde militar, as armas pessoais à bandoleira, o cabelo rapado, aquele ar de operacional blasé, de quem está pronto a meter na ordem todos os rebeldes, insurrectos,…

mas estas forças são mais pluriculturais e chegaram à última hora para impedir que os fundamentalistas descessem sobre bamako. são, segundo o presidente hollande, 750 mas vão ser reforçados. a operação serval começou no fim-de-semana com ataques cirúrgicos ao solo por aviões e helicópteros de combate, mas está a prosseguir com rodas e ‘botas no chão’: chegaram os blindados ligeiros da licorne da costa do marfim e outras forças vêm a caminho.

este tempo e modo das guerras do século xxi continua e replica as guerras do século xx. outra vez a alta tecnologia dos centros desenvolvidos chega às periferias selvagens ou perigosas sob a forma de bombas, mísseis, balas, contendo à distância os invasores, obrigando-os a abandonar posições.

mas estes perdem umas posições e retomam outras. o pano de fundo da guerra é o deserto mais as cidades do deserto como a mítica timbuku. os rebeldes estão embuçados e emboscados, deslocam-se em land-rovers, usam automáticas e rpg-7s, cartucheiras à laia de colares, pertencem a várias obediências islâmicas, lutam também entre si.

neste cenário a ordem de hollande in extremis que pode significar?

primeiro, o estado de necessidade. ninguém se chegava à frente. os americanos não querem mais guerras distantes que as que têm, e a nova equipa securitária de obama, ainda as quer menos. o resto da nato e da ue não quer, nem pode.

no afeganistão, washington e a nato preparam a saída – e não é difícil prever o que virá depois.

o iraque é uma incógnita. a síria sofre do paralelo com a líbia e o medo ao mal que pode vir, contem as veleidades de extinguir o mal presente.

para já, no mali os franceses, perante um perigo claro e iminente que mais ninguém queria ou podia evitar, avançaram. o desenho estratégico é clássico: golpe de força com meios aéreos, blindados, tropa operacional, para conter e amolecer os agressores; depois – aguarda-se a chegada das forças regionais (cedao) – para ajudar o exército maliano a restabelecer o status quo.

aqui já surgem dúvidas: os ‘combatentes de deus’ parecem convictos, fanáticos, não se importam de morrer nem matar. até hoje as tropas da cedao – nigerianos à cabeça – não têm dado grandes provas em combate.

os dois poderes militares regionais do norte – a argélia e marrocos – mantêm uma velha hostilidade, sendo que a argélia tem fronteira com o mali. mas é marrocos que tem um exército treinado e equipado para a guerra do deserto, que poderia, melhor que nenhum outro poder, ser o ‘gendarme da área’. não vai ser fácil.