os milhares de malianos que vitoriavam este presidente da frança, que jurara enterrar a françafrique, o tom triunfalista dos discursos, não chegavam para ocultar uma preocupação de fundo.
que o próprio hollande resumia ao dizer que «o terrorismo tinha sido repelido, mas não estava vencido». esta é a realidade: os militantes fundamentalistas, perante a superioridade militar da força de choque francesa, ofereceram pouca ou nenhuma resistência e retiraram para as zonas montanhosas. e de lá podem resistir e começar uma guerra longa a partir do saara, deste deserto mítico e estratégico.
são conhecidos vários grupos deles como os radicais da ansar dine (‘partidários da religião’), chefiados por iyad ag ghali. estes são salafistas, ‘puros’, contrários a toda e qualquer alteração à letra do islão. os santuários sufistas, no mali e na líbia, foram objecto da sua ira, traduzida em actos de vandalismo. outro grupo é a aqmi – a al-qaeda do magrebe islâmico, onde as rivalidades entre mukhtar, bel mukhtar, ‘mr. marlboro’ (o líder do grupo que tomou in amenas e fez a matança dos trabalhadores ocidentais), abdelmalek droukdel o ‘emir’ ou abou zeid, não afectam a sua perigosidade e operacionalidade.
estes chefes de bando vêm da internacional islâmica do afeganistão e da argélia mas criaram a simbiose regional entre crime organizado e fanatismo político. econtrolam os caminhos dos tráficos (15% de cocaína consumida no mundo, passa por aqui, vinda das américas pela guiné-bissau) de droga, de armas, de cigarros, de imigrantes. os bandos aliam a convicção dos combatentes políticos com os recursos dos negócios ‘sujos’.
se bem que lutem entre si, e que os ‘senhores da guerra’ que os comandam disputam a hegemonia, na realidade estão unidos perante qualquer tentativa de impor a lei e a ordem. e têm forças para ameaçar e subverter um deserto imenso que abrange ou faz fronteira com oito países.
ameaçam uma zona que é vital em recursos energéticos e minerais – gás natural, petróleo, minérios vários – e onde, por isso, a presença de técnicos e trabalhadores europeus é necessária. daí o rapto de europeus constituídos reféns, uns resgatados, outros mortos.
se lembrarmos que, no afeganistão, dezenas de milhares de soldados norte-americanos e aliados não foram capazes de neutralizar os talibãs e estão a sair, não podemos ficar optimistas perante o que se seguirá depois deste impacto da ‘força de frappe’ francesa.
tudo indica que este vai ser outro conflito do pós-pós-guerra fria, outra guerra periférica e suja. haverá vontade e capacidade para a fazer e vencer, nos moldes ideológicos e operacionais actuais?