ora, as eleições em itália mostraram que os eleitores não querem reformas. pode dizer-se mal dos políticos italianos, que de facto não são grande coisa e até exibem casos aberrantes, como berlusconi. mas quem votou nos dias 24 e 25 de fevereiro foi a sociedade italiana.
a austeridade está a ser aplicada em quase todos os países do euro e alguns fora da zona, como a grã-bretanha. esta convergência promove recessões cada vez mais cavadas. um ‘governo económico’ da zona euro, tantas vezes falado, deveria, pelo menos, começar por uma certa coordenação de políticas, evitando que todos estivessem a puxar para o mesmo lado. ora, tal coordenação não existe, bem pelo contrário.
mas os italianos não recusaram apenas alguma dose de austeridade, que em itália ainda não é enorme – os salários italianos continuam a subir, por exemplo. grande parte da economia italiana, estagnada há mais de 10 anos (como a nossa…), é dominada por interesses instalados, que procuram proteger-se, sobretudo da competição.
há reformas necessárias para recuperar competitividade que não trazem austeridade, excepto para quem beneficia de situações protegidas. não são apenas interesses do chamado ‘grande capital’; são também os taxistas que querem manter fechado o mercado, impedindo que circulem novos táxis que lhes fariam concorrência. e as farmácias, os notários, etc.
também em portugal se fazem ouvir os interesses instalados. muitos afirmam querer reformas, excepto as que os afectam. a mentalidade corporativa e o poder das corporações são um facto em itália e em portugal. heranças de mussolini e de salazar, ditaduras que patrocinaram corporativismos de estado.
os problemas do euro não se limitam, porém, às falhas dos estados membros, como a incapacidade de muitos deles (a começar pela frança e pela alemanha, convém lembrar) para manterem contas públicas dentro dos limites do tratado. a arquitectura do euro precisa de ser emendada, o que não é fácil.
veja-se a lentidão com que avança a união bancária, a nova solução ‘mágica’ para resolver as insuficiências do euro. de facto, essa união poderia separar o risco soberano, ou seja, da dívida dos estados, do risco bancário, riscos que agora mutuamente se agravam. mas apenas se deu um primeiro passo: a supervisão dos grandes bancos da zona euro pelo bce.
os passos seguintes para concretizar a união bancária serão bem mais difíceis, até porque alguns deles implicam alterações ao tratado da união europeia (ue). ora, mudar o tratado requer a unanimidade dos 27. e não faltariam referendos para inviabilizar as mudanças. não estou a pensar só no prometido referendo britânico. recordo a rejeição, em 2005, da chamada ‘constituição europeia’ em dois países fundadores, frança e a holanda. de então para cá, o eurocepticismo não fez senão aumentar. ninguém no seu perfeito juízo considera possível mudar o tratado neste clima.
por tudo isto, não estou optimista quanto ao futuro da moeda única, até porque a espanha pode entrar também em crise política, com graves consequências económicas. e encaro com preocupação o futuro da própria ue.