hoje, contam-se mais de 30. «o número de hostels tem aumentado de forma quase exponencial de ano para ano. julgo que ainda vão abrir mais antes de começarem a fechar, o que me parece inevitável», avalia josé miguel carvalho, um dos sócios do spot, que ocupa um prédio de 1935 da autoria do histórico arquitecto arménio losa.
o facto de muitos destes empreendimentos terem aproveitado edifícios esquecidos da baixa, mantendo, na maior parte dos casos, a traça original, é uma das marcas mais positivas deste fenómeno.
numa classificação relativa a 2011 e elaborada pelo sítio hostelworld.com, número um mundial em termos de reservas, os cinco melhores pequenos hostels (ou seja, com menos de 50 camas) mundiais são portugueses e três deles estão no porto. os dois primeiros (lounge e central hostel) são lisboetas.
outro aspecto que se destaca é o pendor temático de muitos deles. o wine hostel é um caso paradigmático de fidelidade a um tema: a escadaria de acesso ao piso principal está repleta de garrafas e caixas de vinho, com destaque, claro está, para o vinho do porto (que até tem direito a uma happy hour, das 22h à meia-noite). os andares são denominados de ruby, tawny e pink & white e os quartos são subcategorias (vintage ou 30 anos, por exemplo).
nascido a partir da adaptação de uma antiga residencial, o wine hostel está a dois passos do epicentro da ‘movida’ portuense, o café piolho. quem se aloja aqui sabe que o silêncio está longe de ser absoluto durante a noite – mas, na esmagadora maioria dos casos, os hóspedes vêm precisamente em busca de animação. «tentamos provocar interacção. a grande maioria dos clientes é jovem e temos algumas festas na área social com preços reduzidos. a exigência é alta, porque, depois do check-out, os clientes costumam receber um e-mail para avaliar a experiência e uma grande parte dá-se a esse trabalho. hoje, os clientes dos hostels têm cada vez mais força e exigem qualidade», explica o gerente luís apolinário.
o amor está no ar
as áreas comuns do wine hostel são extremamente organizadas: a sala tem sofás confortáveis e uma grande mesa que é utilizada pelos hóspedes para as refeições que eles próprios preparam na cozinha. no frigorífico, há uma prateleira free for all, onde os turistas que vão abandonar o hostel (ou compraram demasiada comida) colocam os alimentos à disposição de quem precisar. a entreajuda é uma palavra-chave.
em todos os hostels que visitamos encontramos áreas de convívio com televisão, videojogos, jogos de tabuleiro, guitarras e outros instrumentos. se no verão a tendência é para passar pouco tempo dentro de portas, no outono e no inverno já não é bem assim. no rivoli cinema hostel, por exemplo, há mais de 300 filmes disponíveis. este hostel gerido por três casais nasceu no espaço que o avô de um dos sócios alugava a alunos erasmus. agora tem 40 camas e está pejado de cartazes de filmes e referências à sétima arte, inclusive nos quartos. mesmo ao lado da avenida dos aliados, o rivoli tem vistas únicas e um terraço com espreguiçadeiras; na cozinha há um quadro com os menus e ofertas do dia.
joana gaio, uma das sócias, diz que este é «o hostel do amor»: um casal estrangeiro que se conheceu aqui já veio mostrar os filhos. mas até funcionárias já emigraram devido a relações que se iniciaram no rivoli. o mesmo aconteceu no wine hostel com dois franceses. o ambiente é propício a estas ‘descobertas’, até porque os turistas se mostram agradados com a cidade. «as reacções são de surpresa pela positiva. o porto é um destino que começa a ser falado, mas não é muito conhecido», explica joana gaio. o custo de vida relativamente baixo e o estado degradado de muitos edifícios são duas observações igualmente frequentes.
o gallery hostel está localizado na rua de miguel bombarda, onde se concentram várias galerias de arte. o lisboeta gonçalo castanho, de 29 anos, estudou gestão hoteleira na suíça e encontrou aqui o espaço ideal para desenvolver um projecto ligado às artes, em que os dormitórios têm nome de escritores, arquitectos e pintores do porto. a casa nobre onde terá residido a filha de um antigo presidente do brasil tem um extenso logradouro nas traseiras, aproveitado para uma área de convívio/bar, cozinha e ainda para vários quartos duplos. com um ambiente quase bucólico (nem parece que se está no centro da cidade), estas divisões são o ex-libris de um projecto gerido «como um hotel de cinco estrelas, mas com filosofia hostel». «podemos tratar os clientes por tu, mas sempre com brio e tirando partido do nosso background na área. temos cativado muitos clientes que não conheciam esta modalidade de alojamento, que é um fenómeno recente em portugal. estamos a abrir mentalidades», refere gonçalo castanho.
o lado negro do fenómeno
no oporto poets hostel, a poucos metros da torre dos clérigos, o tema é poesia e escrita (até há uma máquina de escrever pendurada numa parede). o conceito começou em lisboa, em 2005, e depois estendeu-se à invicta, graças a um convite para ocupar a casa da antiga cooperativa gesto. aqui os hóspedes têm direito a walking tours, jantares-concerto, wi-fi nos quartos, cacifos de segurança, vinho quente e jogos. «todos os dias matamos a cabeça a tentar perceber o que podemos oferecer mais e onde podemos ser originais», revela ricardo castro, que também se queixa da lei vigente (que enquadra os hostels na categoria de alojamento local), das visitas da asae – «já os devemos ter recebido mais vezes do que o grupo pestana todo» – e da excessiva burocracia. «temos alguns dos melhores hostels do mundo – não sou eu que o digo –, mas cá dentro parece que somos criminosos», insiste o proprietário.
há um lado menos glamouroso dos hostels que geralmente não aparece nas reportagens e que leva até a que alguns deles não nos abram as portas: no caso do yes!, informam-nos de que «não dão entrevistas» a órgãos de comunicação social portugueses. esta é uma actividade que não está dependente do mercado nacional (o número de hóspedes portugueses é reduzido), mas em que também não se consegue escapar à palavra crise, devido ao aumento da concorrência. além disso, é consensual que há menos italianos e espanhóis a viajar, uma diminuição parcialmente compensada pelo aumento dos clientes asiáticos e brasileiros. «as taxas de ocupação estão agora ao nível de um hotel tradicional e, quando arrancámos, era vulgar mandarmos pessoas embora por falta de quartos», refere josé miguel carvalho, do spot. no entanto, o negócio tem de continuar, porque, mais do que alojamento, os hostels vendem experiências e alegria de viver. o spot é um belo exemplo disso: as festas no pátio das traseiras valeram-lhe um lugar como um dos melhores cinco party hostels mundiais no hostelbookers.com.
