O Papa jesuíta

O The New York Times perguntou o que pode acontecer à Igreja Católica com a eleição do seu primeiro Papa jesuíta. É uma pergunta pouco relevante.

lembremos a história desta congregação. os seus dois princípios inegociáveis são a obediência ao papa e a vocação para o serviço. as expulsões levadas a cabo por quatro monarquias europeias, a supressão da ordem pelo papa clemente xiv, por causa das pressões políticas e por ter sido o alvo preferencial do dogmatismo jansenista, atestam a obediência e a lealdade dos jesuítas ao vaticano. também não devemos duvidar da sua vocação inabalável para o serviço, nem que para isso tenham sido obrigados a pôr de lado certas convenções, ou que se tenham adaptado a outras culturas para uma melhor integração e protecção dos indefesos. se acrescentarmos estas qualidades à dedicação ao estudo e à curiosidade intelectual sem preconceitos, temos todas as razões para perceber que a igreja está em boas mãos.

previsões e desilusões

vítor gaspar é acusado de errar nas previsões. confesso que me espantaria se acertasse. se o tivesse conseguido, teria movido céus e terras para me encontrar com o ministro das finanças munida de um simples boletim do euromilhões. assim, francamente, não me espanta nada que não acerte. não me lembro, aliás, de nenhum ministro de nenhum governo que tivesse acertado fosse em que previsão fosse. e até me surpreende que num país com tão pouca fé haja uma multidão imensa disponível para acreditar em previsões reveladas em ‘pontos percentuais’ e logo por políticos. mas talvez tudo isto tenha o seu sentido: só ficamos desiludidos com aqueles em que acreditámos. o próprio vítor gaspar disse estar «desapontado» com o aumento do desemprego. é uma forma subtil e inaceitável de se colocar do lado de fora do problema. a minha desilusão com vítor gaspar tem mais que ver com os seus ‘desapontamentos’ do que com o facto de não acertar.

gestos de guerra

o jogador do aek de atenas giorgos katidis, de 20 anos, corre o risco de ser banido para sempre do futebol grego por ter feito a saudação nazi (a do bracinho esticado) para festejar a vitória da sua equipa. após ter sido fortemente criticado pelo público em geral, katidis veio explicar que não é fascista nem sabia o que estava a fazer. acredito no rapaz, que é só parvo. mas o problema é sério. com o aparecimento desavergonhado da extrema-direita na grécia e o aurora dourada a ser eleito para o parlamento, com um líder que faz a saudação nazi (a do bracinho dobrado), uma questão de liberdade de expressão corre agora o risco de ser um crime. para grandes males, grandes remédios, por isso estou do lado de antonis samaras, que, por ocasião do 70.º aniversário das primeiras deportações de judeus de salónica para auschwitz, afirmou ser necessário criar leis «contra a violência e o racismo». a grécia está em guerra. todo o cuidado é pouco.

contar histórias

philip pullman, escritor de best sellers e livros para crianças, falou ao telegraph sobre a necessidade de os pais e os professores não estarem a fazer um trabalho tão insistente como deveriam em contar histórias aos seus filhos e alunos. pullman responsabiliza a televisão e a internet, não por aí não se contarem histórias, mas por serem meios que prejudicam uma actividade que se pratica em conjunto. o autor teme que as histórias com as quais cresceu acabem no esquecimento porque não são contadas de pais para filhos e assim sucessivamente. não creio que terá razão, mas compreendo o alerta. é diferente ler uma história num livro ou ouvi-la contada por alguém em quem confiamos. a leitura é importante, mas faz falta a partilha de viva voz, porque a afectividade ajuda a memória. o pior é haver uma perda de capacidade de contar episódios simples. não é só uma questão de a história do capuchinho vermelho se perder no tempo.

clap, clap, clap

recomendo vivamente o artigo de megan garber na the atlantic. é tão bom que até deixo aqui a ligação: http://www.theatlantic.com/technology/archive/2013/03/a-brief-history-of-applause-the-big-data-of-the-ancient-world/274014/. garber conta uma breve história do aplauso desde o seu início, não se sabe bem quando nem como, até aos nossos dias em que aparece substituído silenciosamente por um polegar para cima no facebook ou por uma estrela no twitter. infelizmente, garber não fala do aplauso prematuro e embaraçoso num concerto de piano nem conta se os chimpanzés o aprenderam connosco ou se já batiam palmas sozinhos. são duas questões que sempre me intrigaram. mas fiquei a saber que as famosas claques começaram no teatro da antiga roma. estes primeiros profissionais da manipulação das multidões chamavam-se laudiceni, ou ‘pessoas que aplaudem em troca do jantar’. pelo mesmo preço apupavam os actores rivais. é sempre bom aprender uma coisa nova.