A escolha de Angelina

«Os meus filhos já não precisam de ter medo de me perder para o cancro da mama». Foi assim que Angelina Jolie justificou na passada terça-feira a sua decisão de fazer uma dupla mastectomia para prevenir o cancro da mama. A actriz avançou para a cirurgia depois de testes genéticos lhe darem 87% de probabilidade…

na carta onde tornou pública a sua decisão – publicada no the new york times e que correu mundo – a actriz diz que tomou esta opção pelo futuro dos seis filhos, três deles adoptados, esperando com a divulgação do seu caso ajudar outras mulheres com historial de cancro na família a saber que há formas de evitar a doença. brad pitt, o marido, apoiou a decisão e fez um elogio público a angelina: «como testemunha em primeira mão desta decisão, considero a escolha de angie, assim como de muitas outras como ela, verdadeiramente heróica».

a operação a que a actriz se submeteu (as primeiras intervenções realizaram-se em fevereiro e a última etapa em finais de abril) é a forma mais eficaz de eliminar o risco da doença, mas há alternativas menos radicais.

em portugal, os institutos de oncologia têm pacientes em lista de espera para fazer esta cirurgia preventiva, que é recomendada apenas em casos extremos de risco genético de cancro da mama. «neste momento temos sete mulheres a aguardar cirurgia no ipo de coimbra e nos últimos três anos já operámos dez», explicou ao sol helena gervásio, directora do serviço de oncologia médica neste hospital e presidente do conselho de oncologia da ordem dos médicos. a prioridade, porém, é dada aos doentes que já têm cancro. «normalmente são operadas ao fim de poucos meses».

por ano, nos três ipo (lisboa, porto e coimbra) haverá cerca de duas dezenas de mulheres que se submetem à cirurgia. «a operação já se faz em portugal há muitos anos e é prática comum», adianta o ex-presidente da sociedade portuguesa de senologia, carlos freire de oliveira. «há inclusive consenso na sociedade de senologia sobre esta prática. a sua eficácia está comprovada: a cirurgia reduz em 98% a probabilidade de se sofrer a doença».

calcula-se que 10% dos cancros de mama sejam hereditários, o que significa que em portugal todos os anos são diagnosticados 450 novos tumores da mama que podiam ter sido detectados geneticamente.

há marcadores que permitem avaliar o risco de cancro através de mutações nos genes. além de angelina jolie, outras estrelas como sharon osbourne, mulher do cantor de heavy metal ozzy osbourne, optaram por esta operação radical depois de terem detectado mutações semelhantes. mas nem todas escaparam à polémica. quando allyn rose, candidata a miss america, anunciou aos 24 anos que ia submeter-se a esta cirurgia após o concurso, foi alvo de intensas críticas.

em portugal, qualquer teste genético só é feito nos ipo depois de rigorosas avaliações em que o historial de cancro familiar é esmiuçado. «só quando há mutações em certos genes e o risco é elevado é que se recomenda esta operação. a mulher, porém, tem sempre a última palavra», explica helena gervásio, lembrando que além do cancro da mama, o teste também detecta o risco acrescido de sofrer de cancros dos ovários.

a operação só é recomendada depois dos 35 anos. «nós não aconselhamos que seja feita antes dessa idade», afirma fátima vaz, coordenadora da consulta de risco familiar de cancro da mama e ovário do ipo de lisboa, lembrando que a mulher mais jovem que acompanhou tinha 30 anos quando se submeteu à cirurgia.

o ‘limite de idade’ imposto pelos médicos prende-se com o impacto provocado pela intervenção. logo à partida, porque as pacientes estão numa fase da vida em que formam família e querem amamentar os filhos, explicam os especialistas. por isso os médicos aconselham-nas a adiar a cirurgia até constituírem família, optando até lá por outras soluções.

«há alternativas além da mastectomia. a terapia hormonal e a vigilância apertada – a realização de uma ressonância magnética e de uma ecografia mamária todos os anos», diz matilde ribeiro, directora do serviço de cirurgia plástica do ipo do porto.

o procedimento médico é simples e tanto pode ser feito em hospitais públicos como nos privados. «na operação é retirada a glândula mamária e feita a reconstrução com próteses. normalmente, as doentes são operadas de manhã e saem no próprio dia à noite», explica o cirurgião plástico biscaia fraga, que ao longo da sua carreira já fez esta cirurgia a cerca de 20 mulheres, sobretudo na clínica privada. aí esta operação pode custar entre seis mil a oito mil euros.

joana.f.costa@sol.pt e rita.porto@sol.pt