«tinha preparado a minha introdução em árabe mas tendo em conta que não parece haver aqui nenhum vou falar em inglês», começou a egípcia provocando o aceno de algumas excepções entre os mais de 50 árabes convidados pela ue – os que decidiram permanecer na sala depois de acabado o debate sobre a evolução da comunicação social nos países que derrubaram regimes ditatoriais com décadas de existência.
sem mulheres não há mudança
passaram mais de dois anos desde a queda de hosni mubarak, mas ziada diz viver outra vez no que chama de «democracia iliberal», ou seja, «um regime que se mascara de democracia mas é uma rígida ditadura». a nova constituição do país, redigida pela maioria da irmandade muçulmana do presidente mohamed morsi e aprovada numa votação onde participou apenas 30% do eleitorado, «tem apenas uma referência às mulheres e é sobre a sua capacidade biológica de ter filhos», queixa-se a activista egípcia, que deixou a garantia: «não haverá primavera árabe sem mulheres».
ao seu lado, a bloguista tunisina henda chennaoui dizia que as mulheres árabes não estão «desiludidas» com a fase de transição dos seus países: «estamos furiosas!». apesar de ter sido o berço da primavera árabe, a tunísia ainda não tem aprovada a nova constituição. e as primeiras eleições também deram a vitória ao partido islamista anteriormente banido pelo regime de ben ali, o ennahda.
chennaoui, que diz não acreditar em islamismo moderado, acusa o ennahda de estar a banir as mulheres da política, referindo como exemplo a cidade de sidi bouzid, onde no final de 2010 o jovem mohamed bouazizi se imolou em protesto contra a falta de emprego e deu início ao período revolucionário.
tunísia no limbo
o desemprego continua a afectar mais de um terço dos jovens licenciados tunisinos e a economia só se agravou desde a queda de ben ali, principalmente devido à queda abrupta no turismo, sector que emprega mais de 400 mil tunisinos. com o rating da dívida no ‘lixo’, a tunísia viu o fmi suspender as negociações para uma intervenção, «até que a situação política seja clarificada».
incapaz de gerar os consensos necessários para que uma maioria aprove a nova constituição, o ennahda depara-se também com um conflito interno. em fevereiro, o primeiro-ministro hamadi jebali viu a sua demissão e proposta de criação de um governo autocrático, como forma de acabar com o impasse político, rejeitada pelo próprio partido.
e se os partidos seculares se queixam da tendência religiosa do ennahda, os radicais islamistas do ansar al-sharia tentam convencer o eleitorado que o governo actual ignora a lei islâmica e ganham popularidade distribuindo alimentação, medicamentos e segurança nas zonas mais afectadas pela crise.
descontrolo na líbia
já na líbia, os partidos islamistas acabaram derrotados por uma coligação secular, o que não significa mais progresso. o país continua assolado pelos conflitos tribais e regionais, agravados pelo armamento desmesurado da população durante o combate com o regime de kadhafi. nem o governo transitório nem o actual foram capazes de inserir no exército as milícias que combateram o antigo ditador e a falta de segurança no país foi exposta no ataque que matou o embaixador norte-americano em bengazi, em setembro de 2012.
histórias repetidas durante os últimos três dias em bruxelas, onde os responsáveis europeus reconheceram a culpa de quem «sustentou ditadores durante demasiado tempo», como afirmou o vice-presidente do parlamento europeu, edward mcmillan-scott.
a europa tenta agora corrigir a sua posição – o porta-voz da alta representante para as relações externas garante que «os vizinhos do mediterrâneo são uma prioridade» e foram anunciados programas de apoio ao desenvolvimento dos meios de comunicação nos países árabes em transição. mas não será tarefa fácil: no último dia de conferência, o jornalista líbio mohamed chermat lamentava ter ficado com a ideia que «os ocidentais não fazem ideia do que se passa na líbia».