Obama em Cape Town

Os Estados Unidos têm estado pouco presentes em África desde o fim da Guerra Fria, quando a disputavam aos soviéticos. Mas duas razões de fundo estão a trazê-los de volta. Uma é geopolítica, a outra securitária.

a securitária tem a ver com a luta antiterrorista, com a detecção e perseguição aos grupos terroristas próximos ou filiados da rede al-qaeda a operar no magrebe e no sahel, mas também noutros países africanos como a nigéria e o quénia. o africom, o comando militar norte-americano para áfrica, tem uma rede de meios e forças que, através de acordos bilaterais com países africanos, cooperam em termos de recolha e interpretação de intelligence, de treino e formação de pessoal e às vezes até em operações discretas, de ‘botas no chão’ ou ‘asas no ar’, na luta antiterrorista.

a outra razão do redespertar do interesse norte-americano por áfrica foi a ofensiva político-económica da china.

com o fim de obter concessões de petróleo e gás e também de outros minérios, e de ganhar mercados para o seu comércio e para as suas empresas de construção e obras públicas, a república popular da china desenvolveu uma mega-operação de promoção e charme usando o cash das suas mais-valias comerciais para comprar posições e facilitar créditos aos locais. aplicou-se também, discretamente, a fechar em áfrica as representações de taiwan. não se envolve militarmente e muito menos desestabiliza o que quer que seja, mas também não impõe reservas humanitárias ou democráticas aos seus parceiros.

na ilustração, à século xxi, da rivalidade tucididiana, os estados unidos e a rpc olham-se ambiguamente, ora quase amigavelmente como parceiros nos grandes trabalhos de desenvolvimento e da globalização, ora como rivais em potência, de um novo duopólio pela hegemonia mundial. vai ser assim por muito tempo e a áfrica, com as suas grandes e livres reservas de energia, terra produtiva, minérios e minerais estratégicos e necessários, é um importante espaço vital para estes poderes deste mundo.

é neste quadro que deve ler-se o discurso de barack obama, na universidade da cidade docabo em 30 de junho, um discurso que procurou, na habitual retórica de sedução dos presidentes norte-americanos (e deste presidente particularmente), anunciar as grandes linhas estratégicas e económico-sociais dos estados unidos para o continente.

em vez de ‘despachar comida para áfrica’, os norte-americanos vão ajudar os agricultores africanos, investindo biliões na agricultura. e vão continuar, na saúde, a apoiar o combate à sida (um contributo iniciado pelo seu antecessor, george w. bush). e no campo da energia, vão lançar uma iniciativa, power africa, na qual o governo e o sector privado americanos prometem investir 7 mil milhões de dólares.

do mali à somália e à rdc, os militares norte-americanos continuarão a ajudar os governos locais a combater o terrorismo. e contam com a aliança com a áfrica do sul, para, como está a acontecer no zimbabué, com a redacção da nova constituição e eleições, restabelecerem a ordem, a lei, o entendimento e a confiança e o respeito pela lei.

um belo discurso. aguardemos, com confiança e sem ironia, a sua concretização.