Salvação nacional: os Governos placebo

Em Itália durou um ano, na Grécia apenas seis meses. Na Hungria e República Checa não foram muito além. Os governos ditos de ‘salvação nacional’ na Europa têm tido vida curta, com resultados pouco animadores na sua performance económica.

embora consigam travar a escalada dos juros da dívida pública, acalmar os mercados e introduzir algum controlo orçamental, estes executivos não eleitos acabam por não resolver os problemas de fundo da economia, como a retoma do crescimento ou a diminuição do desemprego. acabam pelo desgaste político, derrotados pela contestação social contra a austeridade. se portugal avançar para uma solução deste género, os resultados não serão muito diferentes, dizem os especialistas contactados pelo sol.

desde 1945, já existiram 24 governos ‘tecnocráticos’ nos 27 membros da união europeia. cinco deles foram criados durante a actual crise do euro: grécia, itália, hungria, república checa e bulgária, o único ainda no activo. portugal, por exemplo, teve dois: o de 1978, com nobre da costa, e o de 1979, com maria de lourdes pintassilgo.

ligações à troika

os executivos de ‘salvação nacional’ ou ‘tecnocráticos’ assumem vários perfis. podem resultar de um compromisso entre partidos, que escolhem entre eles os ministros. foi o que sucedeu na grécia em 2011, com lucas papademos. ou podem consistir numa delegação do poder num executivo apoiado pelos partidos, como aconteceu em itália em 2012, com mário monti.

em itália e na grécia, os governos foram liderados por primeiros-ministros que tinham fortes ligações à troika: monti foi comissário europeu durante dez anos, enquanto papademos foi o n.º 2 de jean-claude trichet à frente do banco central europeu. «os governos tecnocráticos são governos políticos com uma agenda própria que pode não interessar ao país. não são uma alternativa viável para portugal», considera pedro lains, economista e investigador do instituto de ciências sociais.

os governos de salvação nacional durante a actual crise têm surgido como soluções de emergência para evitar episódios que poderiam levar à fragmentação da zona euro, seja a saída da grécia da moeda única em 2011 ou o resgate de itália em 2012.

o efeito placebo dá-se sobretudo no campo financeiro. mario monti conseguiu acalmar os mercados, reduzir os juros da dívida de 7,4% para 4,5% em 12 meses e manter o défice orçamental controlado em 3,8% do pib.

porém, as medidas introduzidas – aumento da idade da reforma, subida de impostos, liberalização de várias profissões e cortes na despesa pública – fizeram a economia afundar 2,4% em 2012. o_desemprego subiu de 9% para 12% num ano e a dívida pública manteve-se acima de 120%.

‘divórcio’ da população

na grécia, a performance económica teve contornos semelhantes. em seis meses no cargo, papademos negociou o segundo resgate grego, fechou a reestruturação da dívida e avançou com novas medidas de austeridade, como o congelamento dos salários da função pública e taxas sobre as pensões mais altas.

o ex-nº2 do bce evitou a saída da grécia do euro e travou a escalada dos juros da dívida, que atingiam já valores acima dos 40%. mas, tal como em itália, o aumento do desemprego (acima dos 22%) e quedas da economia acima de 6% a cada trimestre tornaram a coesão política e social insustentável.

a separação entre a população e os partidos é um dos principais efeitos colaterais deste modelo. “as pessoas sentem que votar em pouco altera a sua condição, que o acto tem mais um efeito de placebo que de uma verdadeira mudança nas suas vidas. o essencial das decisões, sobretudo em matérias económicas e financeiras (mesmo a regulação), escapa ao controlo democrático”, adianta antónio carlos dos santos, ex-secretário dos assuntos fiscais.

luis.goncalves@sol.pt