Depois do Império: percepções paralelas

Churchill and Empire: Portrait of an Imperialist (ed. Weidenfeld & Nicolson, Londres) é o mais recente livro de Lawrence James, um historiador reputado do Império Britânico.

nele se recordam as origens, apogeu e queda do estadista da resistência e da vitória da ii guerra e se revelam algumas das suas percepções e sentimentos (talvez surpreendentes para os admiradores) em relação aos povos e às raças não brancas. chineses, árabes, indianos, africanos, recebem epítetos sarcásticos e às vezes insultuosos. a cosmovisão de churchill é clara e assumidamente baseada na convicção da superioridade da raça branca, sobretudo dos anglo-saxónicos, germânicos e nórdicos.

é certo que não devemos julgar os homens e as instituições do passado pelos valores dominantes hoje, sob pena de acabarmos numa homília moralizadora, panfletária e tola – ao modo de alguns esquerdistas frenéticos e aplicados. churchill tinha a visão racista e supremacista da época tardo-vitoriana: o homem branco levava o fardo do mundo, tinha o dever de conduzir os outros povos para o progresso e para a civilização, e pelo caminho de ir enquadrando, explorando e corrigindo os demais – pelos mais variados meios, que podiam incluir o chicote e o trabalho forçado…

estou a escrever estas linhas e a pensar na visita que fiz, no domingo passado, 28 de julho, guiado por um amigo angolano, herói do seu país, ao museu nacional de história militar de angola, na fortaleza de s. miguel de luanda. o que ali está pode ser um bom exemplo e modelo para as relações entre povos que no passado tiveram uma relação de domínio. ali, as estátuas dos navegadores e soldados portugueses – diogo cão, salvador correia de sá e o colonial henrique de carvalho – repousam, juntas, à sombra discreta das árvores e, ao fundo, podem também ver-se as de d. afonso henriques, camões e vasco da gama.

depois há a galeria dos azulejos, belíssimos e muito bem restaurados, com os temas e os motivos da história político-militar e da fauna e natureza de angola. estes são únicos em inspiração, simbolismo e estética – os animais e plantas de angola, os quadros da história política, as paisagens da selva, dos rios e das cidades.

nas salas da história contemporânea é dominante o papel dos líderes do movimento independentista, vencedor da guerra civil; mas não há ressentimento nem humilhação nem para os colonizadores nem para os movimentos rivais.

sob o sol de um domingo de cacimbo, eu e os meus companheiros de viagem não nos sentimos excluídos nem agredidos pela história ali contada. talvez por que, apesar de tudo o que é o peso das heranças imperiais – em que a glória de uns é a derrota e a humilhação de outros – fomos diferentes e procurámos perceber, unir, integrar. parece que eles, os angolanos, estão a fazer o mesmo. o que é bom e está certo.