o caso remonta a 2009 e pode resumir-se numa ideia: são duas mãos a pedir o mesmo pão. por um lado, a lei de finanças das regiões autónomas diz que as receitas de irs cobradas na madeira pertencem à região. por outro, a lei de finanças locais diz que as autarquias têm direito a receber até 5% das receitas do irs geradas no seu território.
entre março e dezembro daquele ano, teixeira dos santos, então ministro das finanças, mandou as receitas de irs para a região, mas ‘descontou’ os 5% aos 11 municípios da madeira. os autarcas reclamaram e, a partir de 2010, o estado passou a transferir directamente as verbas para os cofres dos municípios, retomando a prática anterior.
contestação em tribunal
só que o ministério das finanças não repôs as verbas relativas ao período entre março e dezembro de 2009. argumentou que já tinha transferido a totalidade das verbas do irs para a região, e que caberia agora ao orçamento regional efectuar a transferência dos 5% para os municípios.
as autarquias contestaram. alegaram que têm o mesmo estatuto dos restantes municípios do país e exigiam ser tratados da mesma forma. e o _caso chegou aos tribunais em 2010, com o apoio da associação nacional de municípios.
o primeiro município a fazê-lo foi o funchal. a autarquia processou o ministério das finanças movendo uma acção no tribunal administrativo e fiscal do funchal, onde exigiu o pagamento de 4,6 milhões de euros, correspondentes às transferências de irs, entre março e dezembro de 2009, acrescidas de juros de mora.
na primeira apreciação do caso, o tribunal deu razão à câmara e condenou o ministério das finanças a pagar. mas o gabinete de teixeira dos santos recorreu para o supremo tribunal administrativo que, já no ano passado, revogou a sentença proferida no funchal e deu razão às finanças.
o supremo considerou que «se pertencem às regiões autónomas as receitas fiscais nelas cobradas ou geradas, incluindo o respectivo irs, conforme considerou o tribunal constitucional, o estado não pode transferir o que não tem».
ou seja, se a região recebeu o irs, caber-lhe-ia fazer a devida afectação, proporcional, aos municípios. isso teria de passar por um decreto-legislativo regional, que nunca chegou a ser produzido na assembleia legislativa da madeira. em vez disso, numa espécie de compensação, o governo liderado por alberto joão jardim preferiu, ao longo dos anos, assinar contratos-programa com os municípios.
inconformado com a decisão do supremo, o município do funchal recorreu para o tribunal constitucional alegando, entre outras coisas, que a interpretação do sta violava o princípio constitucional da igualdade entre os municípios continentais e os insulares, bem como o princípio da autonomia financeira local.
recurso improcedente
a 15 de julho último, o tribunal constitucional julgou improcedente o recurso interposto pelo município do funchal – embora com um voto de vencido do juiz pedro machete (filho do actual ministro dos negócios estrangeiros).
o acórdão do palácio ratton vai contra os argumentos de que há desigualdade de tratamento entre municípios: «tendo em consideração que as receitas de irs, relativamente às quais os municípios [insulares] têm direito a participar, pertencem às regiões onde eles se encontram, contrariamente ao que sucede com os restantes municípios, a desoneração do estado do dever de entregar directamente as verbas correspondentes aos municípios insulares não se revela arbitrária, não ofendendo a exigência de um igual tratamento dos municípios».
este acórdão contradiz um outro do tribunal central administrativo sul, de 22 de março de 2012, que deu razão à câmara da ribeira grande (açores) num caso semelhante de retenção de verbas do irs.