China conquista castelos franceses

É uma das últimas polémicas em França. Empresários chineses estão a comprar propriedades com vinhas e castelos nas grandes regiões vinícolas. O caso mais falado foi o de um luso-chinês, Louis Ng Chi Sing, braço direito de Stanley Ho no negócio dos casinos em Macau.

em frança, nas regiões vinícolas mais nobres como bordéus ou borgonha, o alarme soou contra os ‘invasores’ estrangeiros que começaram a comprar propriedades com castelos e áreas de vinha. primeiro foram os norte-americanos, depois vieram os japoneses e actualmente a luta centra-se contra a mais recente onda ‘invasora’, os chineses.

na região de bordéus já existem perto de 50 proprietários vindos da china e na de borgonha há já, pelo menos, dois, sendo que um, louis ng chi sing, foi por assim dizer o rebentar de enorme polémica a envolver a frente nacional de extrema-direita, viticultores e presidentes de câmara, cada um com os seus argumentos, que vão desde sinais evidentes de xenofobismo a outros de sentido patriótico.

esta última história prende-se com a venda do castelo de gevrey-chambertin, situado a 12 quilómetros ao sul de dijon. edifício começado a construir no século xi e acabado no século xiii, o castelo entrou em 1858 na posse de jacques masson e continuou até aos nossos dias nas mãos da família. no entanto, a morte em 2011 da última proprietária, elisabeth masson miteran, fez com que os herdeiros colocassem à venda o castelo e o seu domínio agrícola de 2 ha, tudo estimado em 3,5 milhões de euros.

de imediato, alguns viticultores da região ofereceram-se para o comprar e estavam mesmo dispostos a dar cinco milhões de euros contra os sete pedidos pelos herdeiros. este grupo queria dinamizar o castelo como polo de atracção turística, mas o que não contava era com uma oferta de oito milhões vinda de um investidor chinês, louis ng chi sing.

chi sing, 60 anos, nasceu em hong kong mas tem também nacionalidade portuguesa por causa da sua ligação a macau. ele é actualmente o braço direito do empresário stanley ho e director geral na sociedade sjm holdings que gere 17 casinos em macau, entre eles o grand lisboa inaugurado em 2007. macau, recorde-se, tem hoje um volume de negócios seis vezes superior a las vegas, isto no que se refere ao jogo.

de imediato os protestos ecoaram por toda a frança. como era possível vender-se um castelo, património nacional? para acalmar estas vozes iradas, chi sing fez entretanto saber que os seus objectivos são puramente afectivos e não têm nada de negócio. propõe-se recuperar o castelo, para o que já contratou um arquitecto francês ligado ao património e as obras estão entregues a empresas francesas. a acrescer a isto, a exploração dos seus 2 ha de vinha, onde existem as castas pinot noir (em maioria) e chardonnay, e de onde podem sair anualmente entre 10 mil a 12 mil garrafas, está entregue a éric rousseau, um grande viticultor que já explora propriedades vizinhas.

chi sing declara-se um apaixonado pelo vinho e em entrevista ao le figaro explica isso mesmo. “nos anos 80 raramente bebia vinho. a primeira garrafa que comprei, a um preço muito modesto, era um corton-charlemagne domaine louis latour 1986. esta minha primeira experiência foi simplesmente divina”, contou. chi sing, que entrou nesta compra com um grupo de amigos em relação aos quais prefere guardar segredo, está disposto a restituir estes 2 ha à sua antiga glória e ao mesmo tempo alimentar a sua veia de coleccionador de vinhos desde há mais de 20 anos, tendo actualmente uma enoteca de 250 mil garrafas.

mas como explicar este apetite chinês pelas propriedades e vinhas francesas? quando os chineses pensam em vinho, vem-lhes logo à cabeça frança, tintos, bordéus e tudo devido ao impacto que o mítico chateau lafite rothschild tem no seu imaginário. depois, porque possuir uma vinha em frança com um castelo na propriedade dá prestígio na sociedade e mercado chineses. e isto é ainda mais importante para um chinês que negoceie em vinhos, porque este país já é o 5.º maior consumidor e o 4.º maior importador de vinhos, sobretudo tintos. a isto tudo, junta-se uma outra razão não menos importante. o gosto chinês é muito sensível aos taninos e prefere vinhos leves, frutados e com bastante cor. ora, ao comprarem vinhas, adaptam as produções aos seus gostos e toda a sua colheita vai directamente para a china.

contrafacção de rothschild

a isto acresce a própria exportação dos vinhos de bordéus, por mão dos franceses, que têm a china como principal importador. e a paixão pelos vinhos franceses é tal que a contrafacção não pára. a própria empresa do chateau lafite rothschild continua a levantar processos judiciais contra empresas chinesas que falsificam o seu vinho e ainda não há muito tempo foram descobertas na china 10 mil garrafas numa casa abandonada, facto muito estranho tendo em conta que a importação global deste vinho é de 50 mil garrafas por ano.

a china, verdadeiro colosso económico que tem também produção de vinho (é já o 8.º produtor mundial) é que não se livra dos sentimentos franceses mais patrióticos e que ainda em junho último, durante a realização da famosa vinexpo, em bordéus, viu seis cidadãos seus, alunos de enologia que visitavam a feira, serem agredidos. a este acto de xenofobia, os presidentes de câmara das principais regiões vinícolas contrapõem com a valorização das suas zonas devido à vinda de chineses para comprar propriedades francesas cujas explorações até estavam praticamente abandonadas. uma polémica que promete durar.

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