foi uma noite recheada de surpresas. em primeiro lugar, porque fomos recebidos num espaço inovador. depois, porque o desafio era enorme: um jantar de harmonização entre conservas e vinho do porto. esta ideia de ‘loucos’ foi entregue à fábrica de conservas de pinhais, à empresa de vinho do porto poças júnior e ao restaurante can the can.
comecemos pelo cenário. o restaurante, situado em pleno terreiro do paço, goza desta vizinhança carregadinha de turistas (a baixa lisboeta está muito bonita e animada) e a sua decoração, toda feita à base de latas de conservas, é um hino ao bom gosto e um convite à boa disposição.
passando ao menu, iniciámos a luta com uma cavala alimada e acompanhada com batata doce, marmelo e funcho. quando a ligação sugerida foi um porto poças pink, confesso que temi o pior e os olhares que comigo se cruzavam anunciaram que não estava sozinho neste meu receio a roçar o pânico. qual quê! este rosé revelou-se frutado, com notas de cereja e framboesa, fresco, suave, a acompanhar muito bem o peixe teleósteo muito comum nas nossas águas e que também dá pelo nome de sarda.
esta primeira experiência não teve o condão de me convencer totalmente e havia que continuar. foi então a vez de chegarem uma ovas de sardinha com mousse de beringela, tomate confitado e ervas aromáticas. e acompanhadas de um porto poças special reserve dry white. há quem o beba com gelo e água tónica (esta a última moda e por acaso bem agradável), agora a ajudar a empurrar uma ovas em conserva… pois bem, outra agradável surpresa. este porto branco, com o seu aroma abaunilhado, casou na perfeição com as ovas. a uma sardinha, sob a forma picante e com courgete grelhada, caberia outro casamento: o poças white, cujo aroma citrino com nuances de ananás deu-se às mil maravilhas com a pequena sardinha.
mas eis chegado o momento supremo. a conserva de sardinha em azeite e com pimentos assados ficou à espera do porto special reserve tawny. e fez bem, porque o final longo e persistente deste tawny levou a velha sardinha a um patamar cheio de notáveis paladares. quando o late bottled vintage 1999 chegou para acompanhar a sobremesa, já todos estávamos convencidos de que há surpresas bem agradáveis e a última, a fechar, chegou sob a forma de fado. a guitarra, a viola e a cantadeira dos fado novato não vieram nem de alfama, nem da mouraria, nem do bairro alto. são norte-americanos e chegaram de kansas city, imortalizada pelas velhas histórias de cowboys. l
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