na apresentação da sua candidatura, manuel almeida queixava-se da ausência dos jornalistas. com efeito, na sala não havia uma única câmara. ou, por outra, havia uma câmara mas não era de televisão. era do teixeira, amigo do candidato, que gravou tudo. e foi quanto bastou. o vídeo foi parar ao youtube e ao facebook e desde daí praticamente toda a gente já ouviu falar do candidato do partido trabalhista português à câmara municipal de gaia.
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frases como ‘se quiser dar entrevista que vá para a praia, que vá para a piscina, que vá para a china’ ou ‘defendo a discriminação entre os pobres, coisa que eu não especulo com a discriminação’ deram a conhecer ao mundo este desempregado de 40 anos.
no concelho que quer liderar, manuel almeida é conhecido por ninja, por dar aulas de artes marciais, mas também por noray, nome artístico que usa em espectáculos musicais onde canta temas da icónica banda dos anos 80 modern talking. tem dois filhos e um neto, trabalhou em lares e foi emigrante em inglaterra, onde esteve quase a ser polícia, mas foi obrigado a regressar a casa devido à doença do pai.
o vídeo – o tal que lhe deu fama – acaba com uma promessa do candidato: “não vou dar mais entrevistas”. mas manuel almeida rompe o blackout com a entrevista ao sol.
quem é manuel almeida?
sou uma pessoa simples, uma pessoa de luta e amigo do amigo.
como vem parar à política?
acho que fui usado por um candidato. ele convidou-me para ser candidato à lista dele, mas a razão dele era usar-me para eu cantar. depois ele acabou por desistir e eu fiquei a nadar.
pois. descobrimos há pouco que também canta, com o nome artístico de noray.
eu canto músicas dos anos 80, dos modern talking. tenho vídeos no youtube. andei muitas das vezes a cantar, a promover-me, mas nunca ninguém me ajudou. corri rádios… não me ajudaram. comecei a cantar em 80 e tal, quando os modern talking gravaram a primeira música. actuo em qualquer lado, tenho ido a karaokes. não é a música original, é música ‘ajeitada’, que é só instrumental e eu meto a minha voz. sei que há discriminação também nisto. há muita gente que não sabe cantar, que não tem voz e qualquer um canta. desde que paguem ou tenham uma cunha, tudo vai para a televisão.
e o vídeo…
eu vejo-me aqui discriminado face a um pobre vídeo, que foi feito por um amigo. não vejo nenhum mal aí. a minha simplicidade, em apresentar a minha candidatura sem grandes meios e não desistir… eu acho que muita gente, alguns partidos, tremeu quando soube que eu era candidato. esta injustiça toda só pode ser por isso, acho que parte por aí.
mas não acha que a popularidade do vídeo pode jogar a seu favor?
percebo que sim, mas não consigo controlar essa percentagem, porque tem muita gente que é maldosa e estão a ofender-me com coisas graves. estão a mexer com a minha família. coisa que eu não especulo com isso, nem admito isso. enquanto cidadão contribuinte e recenseado, acho que mereço a minha defesa. desde que apareceu lá o vídeo a minha vida começou a andar para trás, mexeu com a minha parte psíquica. desde que o raio do vídeo foi para a net que durmo mal, deixei de ter apetite, como mal. acho que cabe à justiça intervir nisto.
admite processar as pessoas que fizeram esses comentários incómodos?
sim. usar um vídeo privado tem consequências. pode comentar-se lá uma crítica simples, agora provocar e fazer ofensas não podem. assim como estou revoltado com as televisões que não me fizeram cobertura na apresentação e agora estão a usar o meu vídeo. essa é a minha revolta.
dá para ver que ainda está zangado com a comunicação social.
foram informados que eu tinha apresentação de candidatura naquele dia e ninguém apareceu. só tiveram a lata de me ligar nesse dia para eu entrar em debates. e eu disse: ‘a minha candidatura vou apresentá-la hoje’. quando a gente organiza alguma coisa e não aparece ninguém há revolta. nós perdemos o controlo daquilo que falamos e as pessoas não respeitam isso. não vejo maldade nenhuma no vídeo.
continua a dizer que não vai a debates? ou melhor, que exige que lhe paguem para isso?
evidente! se eu tiver que ir a debates às televisões, terão que me pagar. se pagam aos do big brother, que andam a fazer sexo à frente de toda a gente, e levam as mulheres às discotecas e pagam-lhes só para estarem lá, eu como cidadão não tenho esse direito? não me fazem cobertura, não me divulgam e estão a usar o meu vídeo – que não é deles – para gozarem comigo? eu agradeço à rtv que me convidou para estar em debate. quem diz que eu não sei falar tem a oportunidade de ver o meu vídeo no youtube ou no canal deles e já vêem se eu sei falar ou não. os outros estão lá de fatinho e de folhas e caneta, a escrever aquilo que falam. eu não preciso de nada para estar a falar. não preciso de estar a ler, porque não sou padre. se fosse, estudava para padre.
foi por ter ficado nervoso ou exaltado durante a apresentação que confundiu ‘especular’ com ‘pactuar’? [por exemplo, na frase ‘eu defendo a discriminação entre os pobres, coisa que eu não especulo com a discriminação’]
eu quero dizer não concordar. ‘especular’ tem o sentido de não concordar. é isto que conheço. não é preciso ter muitos estudos – eu tenho o 12.º ano – e grande gabarito para estar a falar essas palavras caras, uma vez que as pessoas que andam de fatinho e vêm falar palavras caras estão a ler uma comédia. os idosos e pessoas que largaram os estudos cedo têm dificuldades de perceber o que eles estão a dizer. por que é que eles não falam em palavras mais originais para que toda a gente entenda? só falam para meia dúzia de pessoas e criticam quem é humilde.
depois do vídeo, já falou com o presidente do partido?
já. ele ligou-me a dizer que tinha recebido telefonemas a falar mal de mim, porque pus um vídeo e disseram que ia prejudicar o partido. eu disse-lhe que não via nada de especial no vídeo, não estava lá a provocar ninguém. não apareceram os meios de comunicação social nem o pessoal da lista… e não tenho problemas de dizer, porque a lista não passa de uma farsa. não compro as pessoas e alguns deles deram o nome por dar. aparecem se quiserem, se não quiserem não aparecem. nos outros partidos há dinheiro a andar por trás para ir muita gente. eu, como não tenho dinheiro, tive lá pouca gente. se tivesse dinheiro e dissesse ‘vou pagar-vos o jantar’ estavam lá todos.
na altura disse que escolheu mal a sua equipa. foi escolhida por si ou pelo partido?
a minha equipa foi escolhida por mim. só que muita gente está cansada da política e não queria entrar nisto. assim como eu. não vivo da política e a mim enerva-me a política. porque só vejo pessoas a enganar o povo.
tem feito acções de campanha?
várias. conversei com idosos e com amigos sobre a minha entrada na política. como é óbvio disseram-me que, como é um partido pequeno, não ia a lado nenhum, mas uma das coisas que tenho comigo é que não sou de desistir facilmente. vou para a frente com ou sem meios. se quiserem votar em mim, pela realidade e pela pessoa humilde que sou, votem. se não quiserem, votem no melhor, naquele que tem fatinho, que engana, que fala palavras caras, para depois continuar a podridão deste país.
mas está a pensar sair à rua, andar pelos mercados com bandeiras, a distribuir beijinhos e apertos de mão?
estou a pensar fazer isso, mas tenho de ter material [de campanha]. mesmo sem material vou fazer isso. tenho o meu amigo [teixeira] que me vai fazer cobertura. até vou querer ir à ponte dom luís para o lado direito, não para o esquerdo, porque ali está muito trabalho feito. da ponte para a direita está tudo discriminado, porque tem casas já sem janelas. não quero um poleiro, quero é tentar ajudar quem mais precisa. se entrar na câmara vai ser um grande orgulho, mas vai ser uma dor de cabeça porque há muito trabalho a fazer. se ganhar não sou eu que vou levar com as dívidas que lá estão. aquilo vai ter que se resolver, sem dúvida, mas as dívidas não são minhas. não fui eu que governei.
quer dizer que se sente preparado para assumir a presidência da câmara?
sem medo nenhum! aprendi isto: não é preciso ser um bom trabalhador, é preciso ser um bom ‘mandador’. saber distinguir o time de trabalho e de custos. porque, por vezes, gasta-se muito dinheiro em gasóleo, anda-se aí para trás e para a frente e está-se a conversar com o carro a trabalhar. é preciso controlar os custos.
e qual era a primeira medida que tomava?
ver as casas que estão vazias em bairros sociais, que dizem que não há e há. toda a gente tem direito a uma casa. um cão tem direito a uma casota. e depois é levar a cidadania às pessoas. terem respeito umas pelas outras, que não têm. só vivem falando mal umas das outras. e esta vida é curta.