a vida, para a bailarina e coreógrafa, é feita de encontros mais do que de desencontros. como este que a levou até niemeyer ou o que, anos antes, a levou a josé saramago – que dela escreveu que “nem o ar nem a terra são iguais, depois de maría pagés ter dançado”. pagés estava num comboio, de regresso a sevilha, quando lhe ocorreu a ideia para uma próxima coreografia: queria dançar as palavras de saramago, que sempre admirara. “com esta ideia, provoquei o encontro com ele e com pilar. ainda hoje, cada vez que o danço e oiço a sua voz, é muito especial”.
em utopía, foi o encontro com niemeyer que ditou a criação. mas o arquitecto brasileiro nunca chegou a ver o espectáculo de pagés concluído. ainda assim, é o seu espírito que está ali, naquele palco partilhado por sete bailarinos, o guitarrista rubén lebaniegos e o cantautor brasileiro fred martins, e onde as palavras de baudelaire, benedetti, neruda ou do próprio niemeyer ecoam pela praça aberta que pagés imaginou como cenário. “utopía é uma declaração de intenções sobre a necessidade de reivindicar a ética para superar este momento de dificuldades. temos de reivindicar o espírito utópico do ser humano que pensa que o mundo vai ser melhor. temos de perceber que cometemos grandes erros e recomeçar”, remata a bailarina e coreógrafa.
em digressão desde 2011, utopía já passou pelos quatro cantos do mundo e tem espectáculos agendados até 2015. hoje, 21 de setembro, sobe ao palco do grande auditório da culturgest, em lisboa. “é uma utopia viajante”, brinca, ao mesmo tempo que afiança que não há nada como voltar a casa, em sevilha.
natural desta cidade do sul de espanha, maría pagés tinha o flamenco traçado no seu destino. era inevitável: “apesar de acreditar que a minha inquietude pela dança se teria revelado em qualquer lugar do mundo, ter nascido em sevilha levou-me ao flamenco, uma arte total, que abarca toda a essência humana. ali, o flamenco é o ar que respiramos. aprendi a dançar porque preciso de me expressar, a dança revelou-se a minha auto-ajuda. danço por necessidade”. por isso, aos 50 anos, maría pagés quer continuar a dançar. “sem prazos”.