Da Alemanha

Que país elegeu Merkel? Timothy Garton Ash publicou, em Agosto na New York Review of Books, um interessante artigo sobre a Alemanha numa linha desdramatizadora e desconstrutora das imagens mais radicais. Em ‘The New German Question’, Ash cita entre outras, duas frases sobre os dilemas da Alemanha – “Too big for Europe, too small for…

a alemanha, quando se une – isto é, quando a nação alemã consegue meter num estado soberano os seus povos ou parte deles – fica grande demais para a europa. bismarck percebeu isso depois de 1871 e quis tranquilizar os outros europeus, sobretudo dos grandes, ingleses, franceses e russos. guilherme ii não percebeu, e os ingleses não aguentaram uma potência continental que tinha uma população e uma economia maiores que a deles e estava a construir uma frota de alto-mar.

desde 1933 e da subida de hitler ao poder, roosevelt aplicou-se a parar a alemanha; perante a reserva dos ingleses que percebiam que a guerra na europa era o fim do seu império. até chegar churchill. na terceira unificação – a de kohl em 1989 – este problema deixara de ser pois a europa já não era o centro do mundo e foi a frança que quis, com o euro, controlar a hegemonia alemã.

quando merkel proclama o dilema de ser presa por ter cão e presa por não ter, tem razão: há uns exaltados que a comparam a hitler e até uns realistas mais radicais que repetem, com ar sibilino, que a simpática ‘mutti’ angela está a conseguir, por artifícios de dona de casa tranquila, o que o agressivo chanceler não conseguiu com as panzer – mandar no continente.

mas outros queixam-se da falta de liderança de berlim que não quer os eurobonds, nem pagar para mandar politicamente. outros ainda dizem que berlim não paga mas manda.

e se berlim, pura e simplesmente, não quiser mandar?

é capaz de ser o que está a suceder. com mais de 60 anos de república federal e quase 25 de alemanha unida, os alemães continuam com síndromas de um passado que parece não passar e que ninguém deixa de lhes lembrar, a avaliar pelas centenas de títulos que, cada ano, são publicados sobre a alemanha nazi.

o horror à hiperinflação de há 90 anos, visto como causa da ascensão de hitler, o medo de que qualquer modesta manifestação de interesse nacional seja comparada ao imperialismo kaiseriano, com que os dirigentes alemães – conservadores e sociais-democratas – se refugiem no europeísmo radical e asséptico como no repúdio da razão de estado alemã.

o que não impede que a restauração da competitividade da economia do país, há dez anos, tenha sido obra de um governo de esquerda spd-verdes e na base de medidas laborais que a esquerda portuguesa condenaria aos berros e o (nosso) tribunal constitucional vetaria liminarmente.