A passerelle como espelho do mundo

Felipe Oliveira Baptista é o mais internacional dos criadores portugueses, apresentando colecção em nome próprio e à frente dos desígnios da casa Lacoste. Em Paris, o designer apresentou uma colecção na qual regressou ao essencial. Porque é necessário olhar para um mundo em crise e fugir à sofreguidão do louco universo da moda. Fátima Lopes…

os olhos não escondiam as três horas de sono da véspera. não há aqui novidade. de seis em seis meses, quando se aproxima cada apresentação de colecção, a dívida à cama e às horas de sono vai aumentando. é assim com qualquer criador de moda. é assim ainda mais quando estamos a falar da elite que apresenta colecção numa das mais disputadas semanas de moda do mundo: paris.

por isso, na apresentação das propostas para a primavera/verão 2014, felipe oliveira baptista, o mais bem cotado dos designers portugueses, a viver em paris há uma década e a concorrer com grandes nomes como saint laurent ou dior, voltou atrás para seguir em frente.

a duas semanas de inaugurar, a 17 de outubro, a mostra retrospectiva da sua carreira no mude – museu do design e da moda de lisboa; e depois de, nas últimas estações, ter trabalhado estampados mais marcantes, na colecção the sheltering sky, apresentada no gigantesco armazém halle freyssinet, felipe oliveira baptista concluiu que o regresso à origem é importante. porque o momento criativo não vive alheado do que se passa no mundo. e o mundo vive em crise, financeira e de valores. portanto, recuperar o essencial é fundamental.

foi consciente disto, mas também de que marcar a diferença no concorrido mundo da semana de moda de paris – durante a qual são apresentados 100 desfiles –, com uma colecção sobre a simplicidade, é mais difícil, que felipe oliveira baptista criou esta colecção. “trabalhar a extrema simplicidade é o exercício mais difícil que se pode fazer em moda. mas foi algo intrínseco e viral, quis fazer um statement sobre o que é essencial e simples, mas quis fazê-lo de uma forma que tivesse uma certa magia e novidade e que uma mulher queira vestir”. felipe quis fugir à sofreguidão do louco mundo da moda.

pouco depois de apresentar, na semana de moda de nova iorque, a colecção criada para a lacoste o designer de origem açoriana assume que esta colecção pode ter passado a mensagem de que o seu trabalho em nome próprio está mais próximo da linguagem da casa lacoste, por estar “mais depurado e com cores mais sóbrias que evidenciam o lado utilitário da roupa”. no entanto, isto permitiu ao outrora quase arquitecto, voltar a trabalhar com geometria. mas sempre com um sentido prático. “a roupa tem de estar na rua. ver alguém vestir o que eu fiz continua a ser muito especial. apesar de saber que, aqui em paris, ao lado de outros nomes, continuo a ser um desconhecido”.

ainda no âmbito da presença portuguesa na semana de moda de paris – com o apoio do portugal fashion –, também luís buchinho e fátima lopes sentiram necessidade de este exercício de regresso ao essencial: o designer do norte mostrou uma colecção cujo pano de fundo são os livros de esboços, porque “a página em branco será sempre o início de algo novo”; a designer da madeira foi beber inspiração à mitologia e apresentou depuradas e actuais deusas gregas.

raquel.carrilho@sol.pt