em vez de dos habituais amantes de literatura, estudantes universitários ou até donas de casa desesperadas fãs de as cinquenta sombras de gray, eram adolescentes os que compunham a plateia do auditório da tenda dos escritores. um público escolar, facilmente identificado pelas fardas usadas, esperava para ouvir mário zambujal, nuno camarneiro, joão de melo, alice goretti pina e celina veiga de oliveira, a que se juntaram líveo oliveira e diva cunha, poetas originais da cidade.
“quando falei para um amigo que vinha para um mesa de quatro horas falar sobre sexo, ele me falou: é tântrico! e quando lhe disse que eram oito pessoas, ele falou: é uma suruba!”, brincou lívio, dando o mote para a tarde.
foi mário zambujal quem deu início a esta suruba tântrica literária, com um texto divertido, cheio de subtilezas e duplos significados, no qual recordou as páginas clandestinas lidas na primeira juventude de a marca dos avelares, a literatura de cordel que acompanhou a entrada na puberdade da sua geração, e cujo título indicava o traço distintivo da família que dá nome ao livro: órgão avantajado, que descia quase até aos joelhos. e foi através da história de pedrinho avelar que o autor de crónica dos bons malandros foi conquistando a plateia, à medida que declamava os poemas de bocage e maria teresa horta.
durante a tarde houve ainda tempo para se pensar na fronteira entre o erótico e o pornográfico, pela boca de lívio oliveira, descobrir a literatura feminina do rio grande do norte, pelas palavras de diva cunha, conhecer o amor e desamor oriental através dos contos de escritores macaenses, analisados por celina veiga de oliveira, e o o quão difícil pode ser para uma mulher escrever o erótico em são tomé, descrito por alice goretti pina.
e depois foi a vez de joão de melo maravilhar a audiência, com um texto sobre os pequenos e grandes prazeres do corpo, que arrancou uma ovação a todos os presentes. “só há um segredo para se ser feliz: chamar a nós os pequenos prazeres e deixar que os grandes aconteçam por si”, disse, antes de falar sobre os grandes livros que lhe desvendaram o erótico, desde madame de bovary, de flaubert, a lolita, de nabokov.
“já comi enquanto escrevi, já me ri enquanto escrevi. mas nunca … enquanto escrevi”, começou nuno camarneiro, a quem coube a última comunicação do encontro, na qual reflectiu sobre o erotismo. “parece-me que o erotismo é o sexo sem o sexo” ponderou, para depois confessar a dificuldade sentida quando, ao escrever os seus dois romances, quis escrever o acto sexual, indeciso entre uma linguagem técnica, melico-doce ou brejeira. no fim, e sem chegar a nenhuma conclusão definitiva sobre o que é, afinal, o erótico, deixou uma sugestão: “talvez o erótico não seja mais do que o desejo físico pela palavra”.
hoje, último dia do festival literário de natal, no qual o iv encontro de escritores de língua portuguesa se integrava, destaque para aquela que será uma das mais concorridas mesas destes dias: pelas 19h30, caetano veloso junta-se a ao poeta eucanãa ferraz para, juntos, discutirem a poesia na canção e a canção na poesia. no fim da noite, pelas 23h, o cantor regressa ao palco para um concerto gratuito.