Dar dinheiro

Jessica Alexander é experiente em ajuda humanitária e escreve um artigo claro na Slate sobre doações em situações de catástrofes naturais.

a propósito do tufão halyan que assolou as filipinas, atingindo 9 milhões e meio de pessoas e deslocando cerca de 620 mil, jessica alexander escreve que as pessoas não devem aproveitar o momento para fazer uma limpeza no armário e dar os sapatos e os vestidos velhos. os donativos em roupa quase nunca chegam às populações, porque as caixas são atiradas dos aviões e a roupa fica espalhada por terrenos devastados, à mercê dos animais que a rasgam e comem. depois do terramoto no haiti, houve doações de leite materno, porque as mães não conseguiam dar de mamar por causa do choque. o leite não serviu porque não havia como o guardar. por isso, em situações de calamidade há que dar dinheiro às agências e organizações que conhecem os problemas e as necessidades no terreno. assim não há que enganar.

o melhor dos mundos

não sei quem disse que comer é uma actividade a que nos podemos dedicar pelo menos duas vezes por dia durante a vida. concordo, claro. a pergunta seguinte seria: e onde passaria a vida a praticar tão maravilhosa actividade? sem querer discutir com verdi quando canta ‘la donna è mobile qual piuma al vento’ atrever-me-ia a declarar que o salsa e coentros é o restaurante a que não me cansaria de ir duas vezes por dia. sei que para muitos bons garfos a menção deste sítio não é novidade, mas só agora visitei esta maravilha gastronómica alentejano-transmontana, que é como quem diz, o encontro do melhor de dois mundos. só mais tarde soube que se trata de um restaurante criado por dois grandes nomes da restauração lisboeta, belmiro jesus e josé antónio duarte. fica em alvalade, um bairro que não é conhecido pelos seus restaurantes. mas vale a pena atravessar lisboa e ficar a viver, se não puder ser dentro, ao menos ao lado do salsa e coentros.

deixem estar

um artigo assinado por rhiannon lucy cosslett no guardian avisava em letras gordas que as pop stars estão demasiado sexy para as crianças. desde a transformação de britney spears que ouvimos falar deste ‘problema terrível’ que é a sexualização de estrelas de 20 e poucos anos. o ‘problema’ estará nos jovens fãs que estão expostos a imagens que perturbam, na verdade, os seus pais. as crianças não vêem a mesma coisa. imitam a ex-hannah montana de língua de fora, dançam e riem, mas não lhe atribuem o sentido que os adultos imaginam. como crianças que são, um dia vêem a miley e no dia seguinte preferem a popota. no mesmo artigo, a solução apresentada também não é a melhor. proibir os miúdos de ver as mileys de língua de fora só estimula a curiosidade. ainda faz com que observem com mais atenção e tentem perceber o que vêem os adultos naquilo. como quase tudo na vida, o melhor é deixar estar e não dar demasiada importância ao que não tem.

perguntas, perguntas

o crítico stephen bayley, criador do museu do design de londres, publicou um livro intitulado ugly, the aesthetic of everything. o tema é fascinante mas, como não podia deixar de ser, parece mais um livro de perguntas do que de respostas. o conceito de feiura existe porque existe a beleza. o próprio título no entanto sugere que a fealdade é quantitativamente superior ao seu oposto. ainda não li o livro, mas atrevo-me a fazer também algumas perguntas. como podemos chamar àquilo que é normal ou habitual? falo do que não causa em nós nem o espanto da coisa bela nem a repugnância da coisa horrível. a normalidade, o habitual não é nem feio nem belo? dir-se-ia que só o que nos surpreende, para o bem ou para o mal, tem o direito de exigir uma opinião ou uma decisão subjectiva. numa entrevista, bayley diz que o avião bombardeiro b52 é belo. e pergunta se deve excluí-lo por causa da sua função, que é bombardear. boa pergunta. uma espada só pode ser feia?

revistas pornográficas

por causa da violência anormal das declarações do ex-ministro da cultura manuel maria carrilho, dei por mim a passar os olhos por revistas que nunca me despertaram a mínima curiosidade. não o digo por sobranceria. as vidas dos outros até me interessam, mas são as vidas de personalidades desaparecidas há muito. as vidas dos outros que estão vivos também me interessam, mas não as de actores, apresentadores ou futebolistas. é gente como toda a gente e não entendo a necessidade de invadir a sua intimidade com a leitura do que querem ou não mostrar. se casaram, se tiveram filhos, se mudaram de sexo, pois que curiosidade é esta de milhões de pessoas por estas publicações? apesar de o dedo ser apontado aos protagonistas das ‘notícias’, o problema não está tanto em quem vive de exibir a sua privacidade, mas em quem quer saber e falar sobre a vida alheia. sei que não sou a única a achar que é um mundo estranho. penso que é doente. e gosto é de saúde.