de um lado, mário soares no seu constrangedor percurso actual, reúne um leque de múmias ressentidas com a evolução da vida política, em defesa do intocável livro sagrado da constituição (que, por acaso, já foi alterado e revisto mais de meia-dúzia de vezes desde 1982…). de outro lado, o bloco de esquerda vai percorrendo o caminho inverso ao da sua formação: se a sua origem resultou da congregação de vários pequenos partidos e movimentos políticos (entre os quais o psr, a udp e a política xxi), agora assiste-se à gradual desagregação do bloco em novos grupúsculos e microformações partidárias (da ruptura fer, há tempos, ao novíssimo partido livre do eurodepu- tado dissidente rui tavares).
além da erosão da sua base eleitoral e dispersão em massa dos seus anteriores votantes, o bloco enfrenta a pulverização dos seus quadros e tendências. esta resulta mais de dissensões pessoais e egos em conflito do que de divergências ideológicas ou constrangimentos partidários. rui tavares diz que quer «um partido de tipo novo» e para os eleitores de esquerda «que, neste momento, sentem que não têm representação». nada de novo. é o que sempre se ouviu a cada cisão, refundação ou reorganização – desde há décadas – na área política do pcp e do be. tavares adianta ainda que «o lugar que achamos ser o mais dinâmico é precisamente o que se encontra ao meio da esquerda». ao que jerónimo de sousa respondeu a propósito: «mais ao meio ou mais ao lado, eu não sei… enfim, não quero comentar».
a verdade é que, esgotadas ou passadas de moda algumas causas fracturantes, o bloco perdeu a sua razão de ser e utilidade política. e, aparecendo aos olhos do eleitorado como um partido incapaz de fazer alianças ou de sair do protesto para assumir responsabilidades de governar, torna-se excedentário e dispensável.
não deixa, aliás, de ser curioso ver o ex-líder parlamentar do pcp, bernardino soares, tão crítico do governo de direita e das políticas de austeridade, ao ser eleito presidente da câmara de loures, a fazer uma maioria de governação com o psd e a falar nas «dificuldades de financiamento e necessidade de reduzir a despesa, os contratos e custos» do município. não há nada como um choque com a realidade.
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