perguntas:
1. se for eleito bastonário, quais serão as suas três prioridades?
2. que conselho dá aos jovens licenciados que queiram seguir advocacia?
3. as reformas do governo na área da justiça estão a resultar?
elina fraga
‘contra a massificação da profissão’
1. combater a massificação da profissão, que constitui uma ameaça à advocacia enquanto profissão liberal, garantindo que só acede ao estágio quem tenha o mestrado e seja portador de uma preparação científica para poder ser advogado. defender o actual sistema do acesso ao direito e pugnar pela eliminação do sicaj [sistema informático para o registo e pagamento pelo estado do apoio judiciário], através da confirmação automática dos actos que compreendam um acréscimo remuneratório. dignificar o patrocínio oficioso, exigindo o pagamento dos honorários e despesas no prazo legal. queremos também pugnar para que seja obrigatória a constituição de mandatário nos meios alternativos de resolução de litígios, para garantir a plena igualdade das partes e combater a desqualificação e o encerramento de tribunais.
2. que tomem consciência que o fenómeno da massificação está a minar a advocacia, conduzindo à perda da confiança pública, do prestígio e estatuto económico da profissão, que são condições necessárias à preservação da sua independência. já aos que decidam ser advogados, que sejam empreendedores, criativos, dotados de conhecimentos, eficazes na reacção, mas também na prevenção de litígios e na identificação de riscos jurídicos. que sintam a justiça como um valor essencial.
3. as reformas na justiça têm sido determinadas por um conjunto de políticas que favorecem uma pequena minoria de advogados, com ligações ao poder político, que têm um interesse directo na reorganização judiciária e na desjudicialização, que lhes traz novas oportunidades de ‘negócio’. assistimos a um duro golpe na cidadania ao reduzir-se o acesso à justiça e ao suprimirem-se garantias do cidadão. todas as mensagens subliminares ínsitas em tais reformas vão no sentido da menorização do advogado.
guilherme figueiredo
‘criar consensos’
1. as nossas prioridades vão no sentido de um discurso identitário da ordem dos advogados, numa consensualização sobre as grandes reformas da justiça. a primeira prioridade vai para a autonomização financeira e administrativa dos órgãos jurisdicionais da ordem, a reestruturação dos seus recursos materiais e humanos, o início do debate para a reforma do estatuto, a negociação com o ministério da justiça do pagamento atempado do patrocínio no apoio judiciário e a promoção de alterações cirúrgicas ao regime legal de forma dignificante para advocacia. a segunda prioridade é iniciar a ‘construção de pontes’ com as demais entidades da justiça; criando um fórum de justiça com reuniões periódicas, constituído pelos presidentes dos supremos tribunais de justiça e administrativo, procurador-geral da república e bastonário dos advogados. a terceira é relativa ao acesso à profissão e à formação dos advogados estagiários, que tem que ser completamente repensada.
2. aos jovens, aconselho que não venham para advocacia apenas por que não podem ir para outra profissão. e aqueles que querem ser advogados não se iludam: a advocacia não é a representação cinematográfica do sucesso, mas este é consequência do trabalho qualificado, dedicação e o comportamento ético deontológico.
3. para uma verdadeira reforma da justiça, o mais importante é definir claramente medidas conjunturais e estruturais, estabelecendo um consenso alargado com as profissões forenses e as forças políticas no parlamento. caso contrário, continuaremos a assistir a reformas que são sucessivamente alteradas por cada governo, originando avultados prejuízos financeiros, problemas funcionais sistémicos e acentuando o descrédito na justiça.
jorge neto
‘reformar uma ordem estagnada’
1. as minhas prioridades são unir, reformar e inovar. unir porque só se recupera o prestígio da ordem e a sua capacidade de intervenção em todos os azimutes com paz e concórdia no respeito e com estímulo da sinergia da diversidade do exercício da profissão. reformar porque a ordem está estagnada e inerte, tendo de se modernizar internamente e de ser proactiva externamente, na defesa e apoio dos jovens e mulheres advogadas, no combate à desjudicialização e à procuradoria ilícita, na reformulação prática do estágio, na internacionalização da advocacia. inovar porque a ordem tem de se abrir à sociedade, liderando os grandes temas da cidadania, dos direitos humanos e igualdade de género.
2. os jovens que queiram seguir a advocacia devem acreditar no futuro. a advocacia é uma das profissões mais nobres: livre dos tiranos do poder e do pensamento, independente dos barões do dinheiro e dos míseros de espírito, encarna o melhor da natureza humana. mas exige perseverança, combatividade, árduo trabalho e alguma inspiração. e, claro, algum sopro da fortuna.
3. as reformas não têm obedecido a uma estratégia coordenada e coerente. no processo civil, apresenta-se um novo código, mas esquecem-se as duas outras vertentes que deveriam ser simultâneas: a reorganização dos tribunais e o sistema informático. no processo penal, atenta-se contra direitos elementares de defesa do cidadão, com julgamentos sumários em flagrante delito. no mais, há uma onda avassaladora e atentatória da cidadania e do estado de direito, com desjudicialização a pataco nos inventários, arrendamentos, divórcios e outras minudências jurídicas. tudo de forma desgarrada, avulsa, a trabalhar par a estatística e para a troika ver.
jerónimo martins
‘mais união e diálogo’
1. a palavra de ordem da minha candidatura sintetiza o seu objectivo: ‘a ordem para os advogados, justiça para todos’. para o cumprir, é indispensável unir os advogados, retomar o diálogo com as outras profissões do mundo judiciário e dignificar o exercício da advocacia. unir os advogados, respeitando a pluralidade e diversidade de opiniões e os diferentes órgãos da ordem, observando a separação de poderes entre eles e a sua interdependência. tal só será possível se a ordem não continuar uma política de isolamento, criando pontes e canais de diálogo com os outros intervenientes da justiça, bem como com os poderes legislativo e executivo, com vista à resolução dos graves problemas com que aquela se debate. finalmente, a dignificação e recuperação do prestígio social dos advogados é urgente e necessária à defesa do estado de direito e das garantias dos cidadãos.
2. os jovens licenciados em direito devem querer verdadeiramente ser advogados(as). a advocacia não é uma profissão de último recurso, meramente residual. a honra de ser advogado exige muito sacrifício por parte de todos os que querem exercer a advocacia, no cumprimento das regras ético-deontológicas, com o conhecimento de que é uma profissão liberal, sem remuneração garantida no final do mês.
3. a resposta é, infelizmente, negativa. essas reformas, na sua quase totalidade, têm na origem uma perspectiva economicista e traduzem-se numa diminuição muito acentuada dos direitos liberdades e garantias dos cidadãos, bem como do papel fundamental dos advogados, de que são exemplo as recentes leis do inventário, arrendamento, processo civil, custas processuais e apoio judiciário, entre outras.
raposo subtil
‘a ordem deve ser solução e não problema’
1. a normalização da relação da ordem com os advogados e com a sociedade é uma prioridade. o bastonário deve bater-se com firmeza pelos valores fundamentais da advocacia e da justiça, sem abdicar da cortesia e urbanidade que são imperativos deontológicos da profissão. os últimos seis anos demonstraram como é possível gritar muito alto sem ninguém ouvir. também a racionalização dos meios existentes, modernizando procedimentos e cortando em despesas supérfluas como os honorários com prestadores de serviços (mais de 1 milhão de euros por ano). pretendemos ainda uma efectiva e qualificada participação da ordem no processo legislativo, o que não tem acontecido.
2. os grandes desafios que se colocam aos jovens são a qualificação permanente, uma efectiva adesão à deontologia da profissão e a potenciação de novas oportunidades, como as que emergem da advocacia de língua portuguesa. os jovens advogados de hoje são dinâmicos, empreendedores e cosmopolitas, com um papel central no enriquecimento da cultura jurídica. temos grande preocupação com as suas condições de trabalho, sobretudo quando integrados em estruturas de grande dimensão.
3. o ministério da justiça ‘advoga’ pela desjudicialização, subtraindo ao mandato forense relações fundamentais, como o arrendamento, os inventários ou a própria acção executiva. estamos frontalmente contra essa tendência que, ao sugerir a filosofia do ‘faça você mesmo’ e ‘abdique dos advogados’, prejudica os cidadãos. o caminho passa por uma crescente credibilização da ordem e pelo alargamento da sua influência, também junto do governo, para que possa ser invertida a tendência de algumas reformas. a ordem deve ser parte da solução e não parte do problema.
marques correia
‘passar a actuar como um poderoso grupo de pressão’
1. terminar o trabalho de pacificação a que me tenho dedicado e que está a ser posto em causa pela conduta de marinho pinto neste processo eleitoral, cego com a possibilidade de a nomenclatura funcionalizada que criou e alimenta não se conseguir perpetuar no poder. uma vez resolvida a questão interna, a ordem estará em condições de empenhar-se a sério na melhoria do sistema de justiça e representar 29 mil profissionais, muitos deles a passarem por grandes dificuldades. ‘para fora’, a ordem terá de passar a actuar como um poderoso grupo de pressão, batendo-se pelos legítimos direitos e interesses dos advogados.
2. que sigam a sua vocação, que estudem o mais que puderem, que se especializem. ser advogado é hoje uma opção corajosa, um exercício de resiliência e teimosia. preocupa-me a falta de trabalho para muitos, fruto do processo de ‘desadvocatização’ em curso, perante a total passividade da ordem, que tem de deixar de ser politiqueira para passar a ser ‘corporativa’. corporativa no sentido de defender os legítimos interesses dos advogados, de liderar um movimento da reconquista das áreas sucessivamente perdidas de um mercado do qual os advogados têm sido afastados.
3. há reformas feitas a ‘toque de caixa’ que são telecomandadas pela troika, que não tem a mais pálida ideia dos problemas da justiça. os advogados são bombardeados e atropelados por alterações legislativas constantes, sempre mais prolixas – quando não contraditórias. por outro lado, não é a proposta mudança de mapa judiciário aquela que o país precisa: a consumar-se o fecho de muitos tribunais, isso significaria o fim da advocacia local tal como a conhecemos.