Estados Unidos – declínio ou hegemonia

A narrativa bíblica do sonho de Nabucodonosor no Livro de Daniel, em que o jovem judeu cativo em Babilónia reconstrói e interpreta o sonho do Rei, dá-nos a primeira versão da ascensão e queda dos impérios: o gigante da cabeça de oiro, os braços de prata, o ventre e as pernas de bronze e os…

estes impérios caíam e sucediam-se. na moderna história europeia, desde o século xvi, também impérios e hegemonias se sucederam, na terra e nos mares (*).

o caso português não parece integrar-se nestes impérios euroglobais, pois mesmo no seu apogeu, nos princípios do século xvi, com o brasil em ocupação e povoamento, as poucas fortalezas e feitorias nas áfricas ocidentais e orientais, o controlo do comércio do índico, faltou-nos alguma hegemonia na europa para entrar no clube dos grandes impérios. se o tivéssemos feito, teríamos sido os pioneiros entre ‘os modernos’.

não fomos. mas os habsburgos carlos v e filipe ii, a frança no tempo de luís xiv e a grã-bretanha da guerra dos sete anos à grande guerra foram sucessivamente as grandes potências.

e depois das rivalidades de entre guerras, os estados unidos apareceram em 1945, como a superpotência hegemónica, medindo forças com a rússia soviética. esta fragmentou-se no princípio da década de 1990 e os americanos ficaram sozinhos, super-potência única, primeira na força militar, na economia e também na imposição de modelos político-económicos, da cultura urbana dos jovens, dos modos ditados pela música, pelo cinema e pela televisão.

e agora? vão manter a dianteira? vão cedê-la aos chineses, cujos números económicos tanto impressionam? vão decair devagar, como os impérios antigos, ou a hegemonia britânica, ou bruscamente como os japoneses dos anos 30 ou a urss?

o ‘declinismo’ é uma escola universal, transversal a ideologias, épocas ou continentes. os seus corifeus lêem nas tendências e casos do presente o futuro (difícil e decadente) que está para vir. o seu grande profeta no limiar do século passado, oswald spengler, escreveu dois grossos e primeiros volumes da história política e da civilização a falar dessa decadência do ocidente.

mas será que a decadência é irremediável e rápida? o império soviético, um império ideológico, territorial e militar, durou 40 anos e caiu entre a baixa dos preços do petróleo (para a qual bill casey foi determinante, ao convencer os sauditas), a derrota do afeganistão e a utopia reformista de gorbachev.

será que o império americano, com tantas teorias declinistas – desde o impacto do sputnik ao famoso livro de paul kennedy e às permanentes profecias do ‘céu a cair’ sobre os estados unidos -, vai conhecer a mesma sorte um quarto de século depois? por agora não sabemos, pelo que podemos, livremente, entregar-nos à especulação histórico-filosófica e analítica, um prazer bem mais agradável, que debruçar e especular sobre as mágoas conjunturais deste país.

*portugal ascensão e queda – ideias e políticas da uma nação singular, dom quixote, 2013