Velhos nem os trapos

Uma mulher de 75 anos, com o cabelo totalmente branco, que gosta de calçar botas Dr. Martens e cujas lojas predilectas são a Topshop e a Urban Outfitters – mecas da moda para adolescentes. Outra que, aos 87 anos, continua a não dispensar minissaias. Outra ainda que não vive sem usar tonalidades garridas, até porque…

o documentário de sue bourne, fabulous fashionistas, exibido no channel 4, mostra a vida de seis mulheres, com uma média de idades de 80 anos, todas apaixonadas por moda e com uma atitude desempoeirada face às convenções da sociedade sobre o que deveria ser o visual de uma mulher a partir de certa idade. “isto não é sobre ter dinheiro ou poder parecer mais jovem. é sobre ter uma identidade que vá além da velhinha”, ouve-se no documentário.

sue kreitzman (73), jean woods (75), bridget sojourner (75), daphne selfe (85), gillian lyne (87) e jean barker ou baronesa trumpington (91). qualquer uma destas seis mulheres está longe da tradicional imagem da avó. pelo contrário, todas querem demonstra que a vida não termina quando se começa a receber uma reforma. nunca usaram botox nem fizeram operações plásticas, mas querem poder exprimir-se através da moda. querem contrariar a clássica expressão: ‘para a idade que tem está muito bem’. e seguramente não estão preocupadas em ser politicamente correctas. até porque a idade está na cabeça.

a ideia fundamental de fabulous fashionistas é deitar por terra estereótipos e não apenas no que ao visual diz respeito. sue kreitzman, por exemplo, vê a moda como uma forma de arte e desenha muitas das peças que usa. uma forma, diz, de “fugir à tirania da moda”.

já gillian lyne, perto dos 90 anos, trabalha sem parar desde os 40 como coreógrafa responsável pelo cats e pelo fantasma da ópera e acredita que o amor que tem ao seu trabalho é parte da fonte da sua energia. mas, salvaguarda, não se pode baixar a guarda: “quando damos um centímetro à idade, ela fica com um quilómetro”. a verdade é que nem uma pneumonia recente a fez vergar. continua a fazer exercício todos os dias e está casada com um homem 27 anos mais jovem.

mas a que mais se destaca neste sexteto é jean woods. depois de ficar viúva, aos 70 anos, candidatou-se a um emprego na gap, como forma de combater a solidão. era a mais velha funcionária da cadeia de roupa. nem assim desanimou: “só porque temos mais de 70 anos não significa que já não somos capazes de manter uma conversa e um emprego”, explicou ao the guardian. uma ideia reforçada por um dos filhos de jean – alec, de 49 anos – que, no documentário, afiança que a família apoia os gostos da mãe. “ela sempre se vestiu assim e a forma como se veste reflecte a sua personalidade. é uma mulher que se destaca”, diz, enquanto garante que os netos de jean frequentemente pedem conselhos sobre moda à avó. “sempre me interessei por moda, mas ainda mais à medida que fui envelhecendo. gosto de me vestir como quero, sem ter de pensar no que os outros vão achar”, diz jean.

as audiências demonstram a aceitação do público inglês. as seis mulheres têm sido sucessivamente convidadas para palestras e entrevistas, mas as imagens destas fabulous fashionistas também já circulam pelas redes sociais, cativando a curiosidade do público fora de inglaterra.

no entanto, se há quem aponte o documentário como uma “semente da revolução”, outras vozes são bem críticas. no the guardian, a cronista michele hanson escreveu que a bbc estava a desviar a atenção do que era realmente interessante: “estão a mostrar algo que estas mulheres sempre foram e sempre fizeram e dão-lhe destaque apenas porque são velhas”.

a verdade é que, ao longo de 45 minutos, fabulous fashionistas deixa claro que velhas é o último adjectivo que caracteriza estas seis mulheres. “espero que este documentário sirva para mostrar às pessoas mais velhas que devem agarrar a vida”, remata jean woods.

raquel.carrilho@sol.pt