já lá vai o tempo em que o elefante tocava o sino, os chimpanzés faziam malabarismos e os visitantes trocavam pacotes de amendoins com os macacos. hoje em dia os animais já não estão em cativeiro – encontram-se “sob cuidados humanos” – e o jardim assume-se na sua vocação de “centro de conservação, reprodução e reintrodução de espécies em vias de extinção”.
neste campo, o sucesso é tal que josé dias ferreira, curador de mamíferos do jardim zoológico, acaba de ser nomeado coordenador do programa europeu de reprodução (eep) dos leopardos-da-pérsia. tudo começou em 2012 com um projecto de introdução em ambiente selvagem de zadig e andrea, um casal de leopardos que vivia no zoo de lisboa. mas o momento alto da história desta família deu-se quando, a 12 de julho – ao fim de apenas nove meses no parque de sochi, no cáucaso -, andrea deu à luz um casal de crias. um fenómeno que não acontecia há mais de 50 anos na rússia. uma boa notícia também para a espécie, que está classificada como ‘criticamente em perigo’ pela lista da união internacional para a conservação da natureza, que estima que o número total destes animais não atinja os 1.300. os pequenos leopardos já foram entretanto vacinados contra as doenças que podem vir a apanhar por viverem no habitat natural e vão continuar a ser monitorizados por gps por veterinários e pelos guardas florestais do parque de sochi. vivem a nada mais nada menos do que 900 quilómetros de qualquer contacto humano.
mas este não é o único caso de sucesso do zoo de lisboa. “nós reintroduzimos também um rinoceronte preto, uma espécie extremamente ameaçada, na áfrica do sul e esse é também um caso de sucesso porque essa fêmea foi colocada em habitat natural e em poucos anos teve uma descendência de mais de 11 animais”, sublinha o novo coordenador de reprodução a nível europeu.
na verdade, o zoo de lisboa participa em outros 10 programas de reprodução e conservação nos quatro cantos do mundo. dos quais se destaca, além do feliz caso dos leopardos-da-pérsia, os okapis, orangotangos, ursos e, mais recentemente, as tartarugas-de-pescoço-comprido-de-roti. “é uma importante vitória para o jardim zoológico, pois esta é mais uma espécie criticamente em perigo (segundo a união internacional para a conservação da natureza). nos anos 90 foi desenvolvido um plano para evitar a extinção da espécie. quando as condições estiverem reunidas na ilha de roti, na indonésia, prevê-se a reintrodução dos animais que entretanto nasceram nos jardins zoológicos da europa e eua”, refere a curadora de répteis, telma araújo.
os dois tratadores do reptilário – paulo sérgio silva e susana silva – referem que boa parte das suas rotinas para garantir a descendência destas espécies passa por alimentação e higiene adequada: “de manhã, mal chegamos, verificamos se os animais estão todos bem. e temos de ter muita atenção, pois por vezes percebemos que um animal não está bem apenas pela forma como está a respirar ou pela posição em que se encontra. depois começamos a fazer as limpezas, mudamos a água e limpamos os vidros”. a seguir chega a comida do serviço de nutrição – “mas somos nós que preparamos a fruta e verdura e a cortamos de acordo com a espécie e o tamanho dos animais. para as iguanas, por exemplo, podemos dar todo o tipo de vegetais, excepto couve, e, das frutas, não comem citrinos. os répteis herbívoros comem todos o dias, enquanto as serpentes carnívoras não. comem de oito em oito dias ou de 15 em 15, dependendo do seu tamanho”, sendo que a ementa varia desde ratinhos de 20 gramas a coelhos e galinhas com dois quilos, esclarecem os tratadores, que aproveitam para realçar a relação próxima que vão acabando por estabelecer com os animais. “eles reconhecem-nos mas temos sempre que ter muito cuidado. os crocodilos também nos reconhecem e não é por isso que nos aproximamos mais [risos]… nesse caso as distâncias têm de ser mesmo mantidas!”.
menos distância mantêm os tratadores dos golfinhos, um dos pontos altos de qualquer visita ao jardim zoológico. “o treino do animal tem por princípio fundamental uma relação de confiança com o treinador. nós sabemos quais os brinquedos preferidos ou companheiro predilecto de cada animal e ele encontra em nós um elemento não só de segurança mas também de brincadeira”, garante a bióloga sónia matias. como são animais naturalmente curiosos, as suas rotinas variam. passam por diferentes sessões e podem incluir “um treino médico, a toma de medicamentos ou até mesmo uma reportagem! a frequência das sessões pode variar ao longo semana mas todas as sessões são registadas e classificadas, para que se possa acompanhar a evolução de cada animal”. tudo acompanhado por 400 quilos de peixe e moluscos – arenque, spratt, carapau, lula e outras variedades – que são fornecidos ao longo do dia em várias sessões.
a alimentação é aliás, um dos pontos que mais diferenciam os animais que podem ser reintroduzidos em ambiente selvagem e aqueles que vivem – e vão continuar a viver – sob o tal cuidado humano. josé dias ferreira lembra: “qualquer um dos nossos animais que vai ser reintroduzido tem um programa de enriquecimento ambiental através do qual é estimulado em termos físicos e psicológicos. por exemplo, a comida é escondida na instalação para que tenha que trabalhar para conseguir o alimento, naquilo que é uma simulação de uma caçada. depois também fazemos enriquecimento olfactivo, em que o tratador espalha na instalação novos odores, o que vai enriquecer brutalmente o seu espaço. cada vez o grau de dificuldade vai aumentando e isto faz com que nós tenhamos, por exemplo, leopardos (e outros felinos) exercitados, que depois facilmente se adaptam a um ambiente diferente”. que o digam o zadig e andrea…