a polícia judiciária de setúbal vai dentro de dias fazer a reconstituição das últimas horas de vida dos estudantes da universidade lusófona arrastados por uma onda na praia do meco, na madrugada de 15 de dezembro. as autoridades querem reconstituir todos os passos que levaram ao areal catarina soares, joana barroso, carina sanchez, tiago campos, andreia revez, pedro negrão e joão miguel gouveia, o único sobrevivente da tragédia. também as famílias admitem recorrer “a um detective privado para saber exactamente o que se passou naquela madrugada”, explicou ao sol fátima negrão, mãe de pedro.
os inspectores da pj vão fazer aquela diligência para perceber se há, entre todos os factos que vierem a ser apurados, a prática de algum crime – o que pode ajudar a responder às muitas perguntas colocadas pelas famílias das vítimas, que estão convencidas que nesse dia os estudantes, que integravam o governo da comissão oficial da praxe académica (copa) se sujeitaram “a uma prova de fogo” imposta pelo líder, o dux joão miguel gouveia, o único a escapar com vida.
ultimato à comissão de praxe
“por que foram para a praia à noite? por que deixaram os telemóveis em casa? entraram na água para cumprir um ritual? havia mais pessoas com eles naquela madrugada? por que foi joão miguel à casa arrumar todos os pertences dos colegas, após a tragédia?” – são as questões que até agora têm ficado sem resposta, perante o silêncio de joão miguel gouveia, de 23 anos, que está incomunicável desde a tragédia, em casa de familiares.
“não vamos descansar enquanto não soubermos o que se passou naquela madrugada”, garante ao sol fernanda cristóvão, mãe de catarina soares, a jovem de 22 anos que, pela primeira vez, fora eleita representante do curso de turismo na copa. “ela nunca nos disse que iriam à praia. saiu de casa no sábado à tarde, trajada e levando um pacote de massa na mão, a sua contribuição para o jantar na casa alugada”.
a tragédia, encarada inicialmente pelas famílias como um “acidente natural”, está hoje ensombrada por versões mais complexas. “temos recolhido muita informação, que aponta para uma prova de fogo”, diz fátima negrão, explicando que os jovens estariam a cumprir um ritual exigido pela copa. aliás, as famílias das seis vítimas fizeram um ultimato aos membros da copa, organismo responsável pelas praxes de 12 cursos da lusófona, pedindo informações sobre esses rituais. se a resposta não chegar, os pais vão decidir as medidas jurídicas a tomar, numa reunião entre todos, que está marcada para amanhã.
a copa é conhecida entre os estudantes da lusófona pela “rigidez” das suas regras e pelo trabalho e secretismo na preparação das praxes – o que levou vários cursos a não querem integrar a organização, apurou o sol. as vítimas do meco trabalhavam muito na organização das praxes, fazendo reuniões aos fins-de-semana, enviando relatórios ao dux e participando na reunião anual, que em 2013 se realizou numa casa alugada em aiana de cima (no meco, concelho de sesimbra).
as famílias dos jovens continuam à espera também de uma palavra de joão miguel gouveia. “até agora, não houve qualquer contacto”, lamenta fernanda cristóvão. o jovem está a ser acompanhado por um psicólogo da universidade, que criou uma linha de emergência para que alunos, docentes e familiares possam pedir apoio. e aguarda-se que fale com a polícia.
inquérito ganha fôlego
até agora, pouco ou nada terá sido feito pelas autoridades para investigar o caso, apesar de ter sido aberto logo um inquérito no ministério público (mp).
os telemóveis dos jovens continuam nas mãos dos pais, tendo sido revelado publicamente um sms de joana barroso para um colega da copa que não foi ao fim-de-semana e um vídeo feito por pedro negrão na tarde da tragédia (de um passeio a alfarim).
além disso, todas as pessoas que viram os jovens naquele fim-de-semana, incluindo a pessoa encarregue de fazer a limpeza da casa que tinham alugado no meco, dizem não ter sido ouvidas pelas autoridades, mas apenas contactadas por jornalistas.
perante o avolumar do mistério, a investigação ganhou novo fôlego esta semana. o procurador coordenador do círculo de almada, moreira da silva, chamou a si o processo e será ele a interrogar, como testemunha, joão miguel.
a audição do jovem – inicialmente entregue à polícia marítima pelo mp – chegou a estar marcada para terça-feira, mas foi adiada por o processo, que está agora em segredo de justiça, ter sido centralizado em moreira da silva.
o procurador admitiu que o caso necessita de mais meios de investigação e prepara-se para solicitar várias diligências às polícias criminais. os resultados das autópsias feitas aos seis jovens, confirmou o sol junto do instituto de medicina legal, ainda poderão demorar a ser conhecidos, pois o processo demora em média 60 dias. fonte do mesmo organismo adiantou que tudo indica que só no primeiro corpo (o de tiago campos, que deu à costa horas depois da tragédia) deverá ser possível obter o despiste de álcool e drogas. nos restantes, pelo adiantado estado de decomposição, será difícil conseguir resultados fiáveis.
a lusófona abriu, entretanto, esta semana, um inquérito interno para apurar o que se passou. “a opinião pública está a ser intoxicada com notícias e queremos apurar os factos para responder aos acontecimentos” – explicou ao sol o reitor manuel damásio, admitindo que o nome da faculdade tem sido arrastado no processo.
na universidade reina o silêncio. o sol falou com um dos membros da copa, que também foi convidado para o fim-de-semana e faltou. “já participei noutras reuniões, que eram anuais, e nenhuma delas envolveu qualquer actividade na praia”, limitou-se a dizer o jovem, que recusou explicar as regras e rituais da estrutura.
*com sónia graça