BCP condenado a pagar até 35 milhões

O BCP foi condenado ao pagamento de uma indemnização que pode chegar a 35 milhões de euros, pelos prejuízos causados a uma empresa dos Açores que comprou 12 milhões de acções do banco em aumentos de capital, entre 1999 e 2001.

A sentença do Tribunal de Ponta Delgada foi emitida a 30 de Janeiro. Contactado pelo SOL, o BCP limita-se a afirmar que tenciona recorrer da decisão.

Na sentença, o tribunal dá como provado o dano patrimonial que a conduta do BCP causou à Nicolau de Sousa Lima SGPS.

O tribunal, na decisão a que o SOL teve acesso, considera “assente” que a empresa adquiriu acções por um determinado valor e que, posteriormente, para estancar os prejuízos com que era confrontada no seu negócio, “se viu na contingência” de vendê-las “por um montante muito abaixo do que havia pago por elas, sendo que esse abaixamento do valor não se deveu ao funcionamento regular do mercado”.

O tribunal não tem dúvidas de que a instituição financeira violou as normas de protecção em relação a este cliente, que comprou acções do BCP em operações de aumento de capital financiadas a 100% pelo banco, entre 1999 e 2001.

Nos anos seguintes, o valor das acções caiu cerca de 40% e em 2004 a empresa já registava no passivo 71 milhões de euros respeitantes a empréstimos contraídos para a aquisição de acções do BCP.

Em 2007, a empresa vendeu todas as acções que detinha, mas ainda assim ficou devedora de 19,3 milhões de euros. Um lote importante de acções – cerca de 2,2 milhões – foi adquirido em tranches a um preço médio de 27,21 euros por título, com o respectivo financiamento do banco.

CMVM na base da decisão

A empresa entrou com o pedido de indemnização há quatro anos, em Janeiro de 2010, já depois de uma condenação do BCP pela Comissão de Mercados de Valores Mobiliários (CMVM) relativa a aumentos de capital com recurso à venda de acções nos balcões do banco e envolvendo empresas off-shore.

A Nicolau de Sousa Lima “estriba o seu pedido na responsabilidade civil extra-contratual e em razão da violação por parte do BCP de normas de protecção” e o tribunal dá-lhe agora razão, argumentando que tal violação “resulta de forma clara das decisões condenatórias sofridas pelo BCP no âmbito dos processos contra-ordenacionais que lhe foram movidos pela CMVM”. O banco acabou por pagar uma coima de 2,5 milhões de euros e cinco ex-administradores foram também condenados, entre os quais Filipe Pinhal, à data vice-presidente do banco.

De acordo com a sentença mais recente do Tribunal de Ponta Delgada, Pinhal deslocou-se mesmo a Ponta Delgada em 1999 para uma reunião com representantes da Nicolau de Sousa Lima. E foi na sequência dessa diligência que se consumou a relação entre a empresa e o BCP. Segundo o autor da acção, Pinhal apresentou o negócio como “um privilégio, acessível apenas às melhores empresas nacionais”.

A Sousa Lima SGPS pediu 35,1 milhões de euros de indemnização, mas o tribunal remeteu o valor preciso a ser pago pelo BCP para momento posterior – terá de ser apurado em sede de execução de sentença e corresponderá à diferença do preço de aquisição dos 12 milhões de acções e o valor da venda, bem como aos juros que vierem a ser apurados. Contactado pelo SOL, o representante legal da Sousa Lima não esteve disponível para fazer quaisquer comentários.

Empresa foi vendida ao grupo Bensaúde

A Nicolau de Sousa Lima foi entretanto adquirida pelo grupo açoriano Bensaúde. E alegou que os prejuízos causados pela forte desvalorização das acções do BCP determinaram a necessidade da venda.

“A operação de compra de acções para reforço do capital do BCP foi proposta à Nicolau de Sousa Lima num quadro que acabou por não ser cumprido, daí a iniciativa agora desenvolvida em sede judicial”, admitiu o porta-voz da empresa, em 2010, quando anunciou a entrega em tribunal da acção judicial.

Durante o processo, o BCP contestou legitimidade do pedido de indemnização por parte da Sousa Lima, já que a aquisição das acções foi feita pela Sociedade Açoriana de Sabões, detida por aquela SGPS. Por outro lado, alegou a prescrição dos factos por terem passado dois anos da divulgação do prospecto de aumento de capital, e também a má-fé da Nicolau de Sousa Lima, por entender que a menos-valia associada às acções do BCP foi considerada no valor da aquisição da empresa pelo grupo Bensaúde. A nada disto o tribunal deu razão.

helena.pereira@.pt